Dezembro de 2005. Os Palmer, uma família tipicamente unida e feliz, estão experimentando uma idílica
tarde de tranquilidade e diversão na represa de Ararat, Austrália,
quando a filha adolescente, Alice (Talia Zucker), avisa que vai mergulhar. Ela não retorna. Depois que Russell (David Pledger), o pai, e Mathew (Martin Sharpe), o irmão, procuram pela menina na água, e então no mato ao redor, e não a encontram, June (Rosie Traynor), a mãe, liga para os bombeiros, em pânico. As buscas duram toda a madrugada, os Palmer recusando a recomendação da polícia para voltar para casa e descansar. Apenas dois dias mais tarde, o corpo é encontrado, e a certeza da tragédia os acerta como um golpe devastador. Uma vez de volta a casa, a realidade da perda custa a se assentar. A maneira como o quarto da menina foi deixado, bem arrumado e caprichoso, dá a impressão de que Alice regressará a qualquer momento. Naquela primeira noite após o afogamento, Russell recorda-se de ter deixado as luzes do alpendre ligadas a madrugada inteira. "Em caso de ela voltar", ele explica. Russell foi o único membro da família que se deparou com a realidade da morte, pois foi o responsável pela identificação do cadáver. O fato de June e Mathew não terem visto Alice por uma última vez trará consequências que se provarão posteriormente desastrosas. É época de Natal, e os cidadãos de Ararat precisam lidar com a trágica morte sem sentido de uma jovem menina da comunidade. Mathew comenta que foi um período em que família e amigos se sentiram atônitos. Durante o processo da liberação do corpo ao enterro, os acontecimentos pareceram bem irreais.
Dez dias depois, portanto em janeiro de 2006, os parentes começam a perceber fatos estranhos dentro de casa. Barulhos chegam do telhado, às vezes do lado de fora, através das janelas. No quarto de Alice, gavetas parecem ser remexidas. Céticos, os Palmer pensam se tratar de ratos, porém mesmo após as devidas providências, continuam a ter as noites interrompidas por portas que repentinamente se fecham com força, e os usuais ruídos vindos do quarto da menina. Uma das amigas de June comenta que até chegar próximo à casa lhe causava uma sensação ruim, como se houvesse algo de errado com o lugar. June é atormentada por sonhos desagradáveis e muito reais, o mais terrível e recorrente aquele onde Alice regressa da represa, ainda pingando de encharcada, de pé ao lado da cama, silenciosa e aterrorizada, encarando-a. Quando fevereiro chega, os pesadelos se tornam tão frequentes que June passa a evitar o sono, e para se distrair, começa a fazer caminhadas pelo bairro, ficando fora por horas. June está tão confusa que começa a invadir as casas dos vizinhos, de madrugada, apenas por escapismo, para dormir em suas salas, e sentir-se inserida em uma outra realidade, absolvida de toda a dor. A seu turno, Russell, um talentoso arquiteto, mergulha no trabalho para sublimar a perda, o que chega a causar algum constrangimento entre os colegas de escritório, que não sabem como ajudá-lo.
Uma noite, em fevereiro, depois de voltar para casa, Russell está tomando solitariamente um cafezinho na cozinha, quando escuta o barulho vindo do quarto de Alice. Ao investigar, encontra a própria filha, `a escrivaninha, como se nada tivesse acontecido, distraída com alguma coisa. Quando a menina o vê, levanta-se e vai em direção ao pai, gritando "Saia, saia". Russell corre, assustado. Com a comoção, acorda esposa e filho, que o encontram aos prantos, no corredor. Mathew segue cada dia mais isolado e distanciado. Quando marcas estranhas começam a aparecer pelo corpo, os pais o levam ao médico, que o testa para todas as doenças possíveis e não chega `a conclusão alguma. Algum tempo depois, as marcas somem.
Mathew procura um cavalheiro que é profissional de imagens e fotografias, louco para aprender técnicas de manipulação de filme. O senhor o admite como uma espécie de estagiário, e logo o rapaz se prova de enorme valia. Pelos últimos quatro anos, como hobby, de três em três meses, Mathew costumava fotografar o quintal de casa, sempre do mesmo ângulo, capturando as mudanças ao longo do tempo, as colinas de Ararat ao fundo. Naquele ano de 2006 em particular, a foto registra um curioso fenômeno: de pé e mais próxima `a cerca, se você prestar muita atenção, enxergará uma menina que parece ser Alice. Depois de levar a imagem aos pais, os ânimos melhoram. A imagem da filha meio que reacende as esperanças dos Palmer. Simultaneamente, ao registrar em fotos a beleza do lugar, um cidadão de Ararat chamado Bob Smeet, `a passeio pela represa, acaba por capturar, da outra margem do lago, a imagem de uma garota de cabelos compridos, de pé, ao lado de um tronco. Os Palmer convencem-se de que Alice ainda está viva. Eles conseguem obter autorização para a exumação do corpo, para a realização de exame de DNA, de modo a comprovar se seria mesmo o corpo de Alice que tinham enterrado. Resultados comprovam que o DNA bate com o de Alice. Fica a pergunta "E as imagens nas fotos?".
A família continua a escutar barulhos pela madrugada. Mathew resolve preparar a casa com câmeras, de maneira a capturar o que está se sucedendo. O resultado das filmagens é perturbador: uma pessoa cruzando o enquadramento, deixando a sala em direção `a porta principal, aparecendo muito brevemente pelo corredor. June decide procurar pelos serviços de Ray Kemeny (Steve Jodrell, dando a performance excepcional do filme), um senhor conhecido pela habilidade em contatar os mortos. Kemeny tem um programa de rádio e é uma espécie de celebridade em Ararat. Os cidadãos têm ideias muito diferentes sobre sua pessoa, alguns o chamando de charlatão, outros certos de que Kemeny os ajudou como ninguém mais conseguiria. Ray é muito procurado por pessoas que perderam entes queridos, ou mesmo aquelas que estão para morrer e desejam um pouco de conforto quanto ao "outro lado". Kemeny tenta fazê-las entender que a morte não é um amargo fim, mas "o começo de algo novo". June faz uma consulta preliminar com Ray, que a hipnotiza. June se vê diante do próprio alpendre, a voz de Ray a orientando a entrar. June entra e encontra a sala vazia. Segue até ao quarto da filha, e encontra o seu tênis do lado de fora. June empurra a porta, e a encontra sentada na cadeira ao lado da cama. Em seu rosto, traz uma expressão muito triste.
June leva Ray para casa, e apesar de reticente, Russell o trata com educação e cordialidade. Os Palmer fazem uma oração com Ray, e Mathew deixa a câmera sobre o tripé, filmando o encontro. Kemeny não consegue contatar Alice, todavia é apenas no dia seguinte ao examinar a filmagem que o menino descobre a irmã, assistindo a tudo, triste e silenciosa, ao final do corredor. Os pais ficam abismados, pois o rosto é claramente o de Alice. Mesmo Ray reage com desconcerto, porque até então, apesar de lidar com o mundo espiritual, jamais vira um espírito com tamanha riqueza de detalhes. Com a ajuda do rapaz, Kemeny instala três câmeras permanentes, por ângulos apropriados a cobrir os principais cômodos da residência. `Aquela altura, os amigos dos Palmer, até mesmo a senhora da força policial de Ararat que acompanhou a família das buscas pelo corpo ao luto, nutrem sérias dúvidas quanto a intenção do investigador. Ainda assim, Ray traz `a unidade familiar algo semelhante a uma reconfortante amizade, e não custa a se tornarem unidos, Ray participando da festa de aniversário do rapaz, em julho do mesmo ano. As câmeras fazem novos registros fantásticos. Uma delas, colocada no quarto da menina morta, revela a imagem de Alice penteando-se diante do espelho. Os Palmer mal têm tempo de processar o ocorrido, pois antes de pensarem a respeito, nova reviravolta põe o caso de ponta cabeça.
Os Wither são um casal de Ararat. Eles estavam na represa em abril, no mesmo dia em que Bob Smeet capturou a foto do fantasma de Alice. Os Wither registraram os bons momentos `a beira da bonita represa. Meses depois, ao revisitarem as imagens, dão pela presença, ao fundo, do cavalheiro que fez a foto. Como cidadãos de Ararat, os Wither estavam a par de toda a questão a envolver os Palmer e a foto tirada `a beira da represa. Um pouco mais adiante, na fita de vídeo, os Wither percebem uma outra pessoa, da outra margem do lago. Após manipulação de brilho e contraste, o senhor Wither conclui que havia outro visitante, e que não era uma menina, tampouco um fantasma, mas o próprio Mathew Palmer.
Quando Bob Smeet tirou a foto, o que se pensava ser o fantasma de Alice não passava de Mathew, vestido com peruca e uma das roupas da irmã, para forjar a presença do espírito inquieto de Alice. Mathew também tinha amplo conhecimento de manipulação de imagens e fotografias. As filmagens e os retratos haviam sido adulterados pelo próprio garoto, que o fizera para dar alguma esperança `a família e, de certa forma, ajudá-los a sentir Alice novamente próximo. Mathew compreende que ao procurar ajudar, acabou por tornar as coisas piores para June, que acabou devastada e com as esperanças estraçalhadas.
Preocupados com o filho, os Palmer permitem que o menino acompanhe Ray em uma viagem de três dias para consultas em algumas das cidades mais próximas a Ararat. Ray se tornou uma espécie de "tio mais velho" camarada, com quem o rapaz se sente mais `a vontade para se abrir. Apesar de muitas pessoas terem reserva quanto a natureza do trabalho de Ray, ele é essencialmente um homem de bem. Durante a viagem, até pelo tipo de trabalho de Kemeny, Mathew percebe o quanto sente falta da irmã morta. Ele finalmente está se permitindo enfrentar os estágios iniciais do luto. Antes de partir para a estrada com Ray, Mathew deixa novas câmeras ligadas, comprometendo-se com os pais a jamais adulterar as imagens novamente. Ao retornar para Ararat, em 22 de agosto, o rapaz checa os tapes, e para o choque de todos, captura uma verdadeira presença dentro da casa e ao longo dos corredores. Pela primeira vez, os Palmer veem um registro muito autêntico do que parecer ser o espírito da menina afogada. A novidade inspira os Palmer a revisitar os velhos tapes. É claro que agora sabem que muita coisa foi manipulada por Mathew, mas com a ajuda do filho, buscam filtrar algo que talvez não tenham percebido anteriormente. E eles tinham razão, pois em uma fita de julho, ao reverem a imagem de uma figura passando ao final do corredor, e Mathew deixar claro que não se trata de efeito adicionado, percebem que algo ou alguém de fato vinha rondando a casa. Trata-se de uma pessoa autêntica, "dando uma volta" pela residência dos Palmer, em plena madrugada. Com muito horror, June reconhece no invasor a fisionomia de Brett Toohey, o vizinho. "O que esse homem está fazendo na minha casa, no quarto da Alice, mais de seis meses após a sua morte?", é a pergunta de June. A mãe vasculha o quarto da garota, em busca de respostas, e as encontra, na forma da maleta da filha, onde escondia o diário e uma misteriosa fita de vídeo. O conteúdo da fita mostra uma realidade que os Palmer jamais poderiam imaginar.
Os Toohey eram velhos conhecidos e amigos da família Palmer. Alice costumava tomar conta dos dois menininhos, de cinco e nove anos, filhos do jovem casal, desde 2002, um trabalho que manteve pelos dois anos e seis meses seguintes, ou seja, muito próximo `a época do afogamento na represa. Não havia nada no comportamento do casal, cidadãos acima de qualquer suspeita, que sugerisse o segredo imundo revelado pelas imagens da fita. Os jovens do bairro lembram-se dos Toohey como "pessoas legais", que estavam sempre promovendo churrascos `a beira da piscina e se comportando de maneira jovial e gentil. Em uma das cenas mais fortes do filme, o conteúdo do tape é exibido: vemos Alice ligeiramente "alegre" (bêbada), após a festa, conversando em cima da cama com a mulher. Em seguida, chega o homem, que havia deixado a filmadora no tripé, preparada para gravar o encontro. Ele diz "Estou vendo que começaram sem mim". Inicialmente, não compreendemos do que está falando, mas então no frame seguinte, estão todos sem roupas agarrando-se, Alice praticamente "devorada" pelo casal, em uma cena que apesar de não mostrar muito graças `a qualidade da fita guarda força em seu inegável poder da sugestão, quando são o choro e a inércia da garota, devassada na cama pelos Toohey, que mais tornam o segmento uma revelação aterrorizante, perturbadora e memorável. Em uma fração de segundo, escutamos um gemido semelhante a uma risadinha, ou a um choro, vindo de Alice, e o mais perturbador é jamais sabermos do que se tratou.
"Por que vocês acham que Alice guardou o tape?", o entrevistador pergunta, e Russell responde, sem vacilar, "Porque ela não queria que eles o tivessem". Na opinião dos pais, Alice vinha mantendo encontros sexuais com o casal porque talvez tivesse se apaixonado por um dos dois, o homem ou a mulher. Eventualmente, despertou para o fato de que os Toohey estavam, em última análise, usando-a psicológica e fisicamente, e que o seu único trunfo residia na fita de vídeo. Foi por isso que os Palmer escutavam os barulhos vindos do quarto de Alice, de madrugada, logo após a morte: Brett Toohey estava desesperado para descobrir onde a menina deixara o VHS, pois sabia que se os Palmer descobrissem, ele e a esposa estariam em maus lençóis com a Lei. Até onde sabiam, tinham cometido estupro, pouco importando o consentimento de Alice, menor de idade à época do início dos encontros sexuais. O fato de a menina ter somente quinze anos quando do começo das "sessões" já consistia prova suficiente para o crime de estupro. Brett e Marissa Toohey se mudaram de Ararat seis meses após a morte de Alice, e quando o tape é encontrado pelos Palmer, não há muito a fazer.
Há mais uma surpresa. Ao folhear o diário de Alice, June encontra o cartão de Ray Kemeny: a menina o procurara pouco antes da morte para uma consulta, e Ray jamais revelara o encontro aos Palmer. A data no diário aponta para julho de 2005, praticamente um semestre antes do afogamento na represa. Na fita da consulta, vemos Alice e Ray `a mesa, conversando. Alice pergunta se Kemeny consegue interpretar sonhos, pois vem tendo pesadelos terríveis. Ray conduz uma sessão de relaxamento & hipnose, e pede para que se concentre e feche os olhos. Ele a instrui a se imaginar no jardim de casa, e é isso que Alice faz. Ele pede para que abra a porta, entre tranquilamente pelo alpendre, e lhe diga o que vê e sente enquanto adentra na residência. Ray explica que quando foi procurado pelos Palmer não contou sobre a sessão por uma questão de sigilo profissional. Ele queria ajudar a família, e acreditava que se tivesse avisado que a menina requisitara seus serviços, estaria apenas atrapalhando a missão de conduzi-los através do luto. June diz que depois da descoberta, perdeu a confiança em Kemeny. A família rompe contato com o psíquico. Ray atribui o ressentimento ao fato de não ter conseguido prever a morte da menina, dali a cinco meses no futuro.
No diário, novos indícios de que de alguma maneira a menina pressentia a própria morte. June lê um trecho muito perturbador "Tive um sonho ontem `a noite. Estava molhada e com frio. Sentia-me pesada, como se tivesse sido drogada, e quando acordei, a sensação não desapareceu. Sentia-me enjoada e confusa, e estava começando a me assustar, precisava ver mamãe, para conversar com ela. Cambaleei até a seu quarto, e enquanto estava de pé a seu lado, observando-a, fui assaltada por uma intensa tristeza, que se tornou medo, quando percebi que não havia nada que meus pais pudessem fazer por mim. Nunca me senti tão só na vida. Tudo parecia errado: meu corpo, a maneira como as coisas pareciam. Então compreendi que havia algo de errado comigo. Comecei a chorar, ao pé da cama".
A menina ocupou uma folha inteira do diário com menções a "Lago Mungo", uma enorme paisagem desertificada que de muitas maneiras se assemelha a uma infindável praia, situada no sudeste de New South Wales. Alice esteve em "Lago Mungo" com as amigas do colégio, em uma excursão, dos dias 2 a 5 de agosto de 2005. Segundo June, quando a filha voltou para casa, parecia feliz, afirmando que tinha se divertido bastante, apesar de ter perdido o celular, o bracelete e o relógio. Kim, a melhor amiga de Alice, fez registros com o celular da noite do dia 05, no "Lago Mungo". Ela e o ex-namorado de Alice procuram pelos Palmer para exibir as imagens de Kim. Não há nada de incomum, no entanto, nas imagens, Alice parece definitivamente angustiada, e é vista enterrando um invólucro que contém celular, bracelete e relógio. Algo nas imagens convence os Palmer a visitar o "Lago Mungo". Os pais precisam saber o que incomodara a menina a ponto de ter enterrado as próprias coisas nas dunas.
Estamos em fevereiro de 2007. Os Palmer visitam o "Lago Mungo", e começam a cavar pelas dunas. Quando menos espera, June encontra o saco plástico onde Alice escondera as posses. É quando a família vai averiguar as imagens feitas no celular que encontra uma imagem assombrosa (o mais eletrizante momento do filme, uma das cenas mais perturbadoras já levadas `as telas). A filmagem daquela noite, anos atrás, começa de maneira inocente, Alice passeando solitariamente pela imensidão entre dunas, as amigas brincando em algum outro lugar. Alice começa a se aproximar de uma figura que está parada mais à frente, aparentemente uma menina da excursão. `A medida que se aproxima, Alice vai revelando melhor a natureza da "visitante": o que está vendo é a si mesma, morta, afogada, com a mesma expressão com que seu cadáver seria de fato retirado da represa. Alice filma o seu próprio fantasma, portanto, vindo do futuro, provavelmente para lhe avisar que a morte estava chegando. Apesar de breve, a cena faz o coração saltar pela boca, um grande triunfo do diretor, que construiu todo o filme em torno deste único instante, cuja força, mesmo seis anos após o lançamento, parece incomparável. Ao assistir `as intrigantes imagens, os Palmer finalmente encontram a resolução para os mistérios que revolviam a morte de Alice. Quando a menina enterrou o celular, o bracelete e o relógio, fê-lo simbolicamente, certa de que a morte estava para ocorrer dali a alguns meses. Alice sabia que ia morrer, apenas não quando, e queria deixar o material para trás, para que um dia, talvez, os pais o desenterrassem.
Em um curto espaço de tempo, os Palmer descobriram o que se sucedeu `a filha nos braços de Marissa Toohey, o segredo da consulta com Ray Kemeny e a filmagem misteriosa em "Lago Mungo". Quando retornam para Ararat, sentem-se emocionalmente exaustos, porém felizes. Pela primeira vez, a casa lhes parece diferente, mais suave e arejada. June diz que a filha finalmente retomou a jornada rumo à eternidade, em paz com o fato de os pais terem descoberto seu mais inconfessável segredo, e ainda assim, amarem-na incondicionalmente. Não demora aos Palmer começarem a se sentir novamente uma unidade familiar e retornar a suas vidas de onde as haviam deixado. Seis meses se passam, até que Ray liga para os Palmer, e avisa que estará passando por Ararat pelos próximos dias, a trabalho. A família meio que superou os ressentimentos, e aceita reencontrá-lo. Eles o recebem muito bem, retomando a amizade, sem qualquer tipo de mágoa. Nós os vemos fazendo um piquenique juntos.
Decididos a seguir em frente, o próximo natural passo é vender a casa e procurar por um novo lugar para recomeçar. Os Palmer fazem uma animada festa de despedida, e os ânimos parecem ótimos. O filme conclui com uma última consulta psíquica de June com Ray. Nesta cena, o diretor Joel Anderson contrapõe dois momentos muito distintos: assistimos `a última consulta de June com Ray, entrecortada pela consulta de Alice, quando viva. Concentrada, June "entra na casa" e chega `a porta do quarto da filha. Ela abre a porta, encontra o quarto muito bem arrumado. June diz que Alice não está mais lá. Simultaneamente, o diretor Anderson nos remete `a consulta de Alice com Ray. Na consulta, feita um ano antes, a menina também foi submetida à hipnose, e estava "visitando a casa". Ao contrário de June, porém, que nada viu, Alice diz a Kemeny que enxerga a mãe, e que ela parece não se dar pela sua presença. Alice inclusive a vê deixando o quarto, tranquilamente. Este momento nos mostra que o amor de mãe e filha foi tão espetacular que as duas tiveram como dobrar espaço e tempo, mesmo por um ínfimo momento, para encontrar-se em um mesmo lugar, graças `a ajuda de Ray. Todos estão em paz. Agora, Alice pode seguir em sua jornada em direção `a luz, e os Palmer, fazer de suas vidas o melhor possível, a dor da tragédia definitivamente superada, substituída pela doçura das recordações de dias mais felizes.
Nos créditos finais, o diretor Anderson exibe novamente as imagens manipuladas por Mathew. Desta vez, aprendemos que muito embora o menino tenha acrescentado a irmã em algumas das filmagens, em todos aqueles momentos, o verdadeiro fantasma da menina sempre estivera presente. Anderson nos mostra com um destaque circular as vezes em que o real espírito atormentado de Alice aparecera para pedir ajuda, em uma montagem arrepiante que nos mostra que desde o começo, a menina afogada estivera entre os entes queridos, que haviam se distraído com as montagens de Mathew, quando de fato tentava se comunicar.
Lançado com pouco alarde em 2008, não custou a "Lake Mungo", um surpreendente, psicologicamente enriquecido ensaio sobre as consequências da morte em família e do luto, ganhar a atenção de público e crítica nos festivais de cinema especializados em Horror. O suspense, dirigido pelo novato Joel Anderson, chegou aos Estados Unidos em 2010, no conceituado After Dark Horrorfest, que sempre nos traz extraordinárias novidades do cinema independente, tais como "Dread", adaptação do conto de Clive Barker, e "Mulberry Street", mas já havia feito fama anteriormente, em importantes competições em Sydney, na Austrália, e no Reino Unido. Há alguns anos, os produtores da refilmagem de "O Chamado" compraram os direitos sobre o enredo original, todavia o novo filme jamais deixou o papel. Uma vez que se esteja familiarizado com a trama, parece compreensível por que a refilmagem jamais saiu das fases muito iniciais de concepção.
É difícil imaginar que um remake consiga capturar a magia do original. Visualmente, o filme é um esplendor, mas isso não é mérito exclusivo do talentoso diretor de fotografia John Brawley. O deslumbre se deve a uma de suas grandes estrelas, a encantadora Austrália. Brawley pincela noites e madrugadas com um azul aquoso, místico e nostálgico, e captura o espaço com lentes de ângulos bem abertos, para nos dar uma ideia da envergadura do outback australiano. As cidadezinhas são lindas e tranquilas, ruas muito espaçadas, igrejas e comércios que evocam um saboroso sentimento de familiaridade, de se viver em comunidade e se estar em casa. Ao mesmo tempo, há um sabor de "road movie" pela maneira como o diretor Joel Anderson filma auto estradas e colinas, sempre ao fundo. "O Segredo do Lago Mungo" é um dos filmes mais esteticamente lindos que já vi, e se levarmos em conta o pequeno orçamento que a equipe teve para contar a história, renderemos a devida homenagem a esses espetaculares profissionais, os diretores de fotografia, os homens que dão o tom correto`as fantasias. Até o momento, "O Segredo do Lago Mungo" é o momento profissional mais destacado da carreira do Sr. John Brawley, mas pelo seu olhar romântico e nostálgico, afirmo sem titubear que o seu nome merece figurar ao lado do de Morten Soborg como um dos gigantes de seu ofício.
As performances também são espetaculares, e fui pego de surpresa por não reconhecer nenhum destes maravilhosos atores australianos. Talia Zucker oferece algo de soturno e misterioso com sua beleza diferenciada, uma melancolia muito semelhante à de Selma Blair, por exemplo. Com o expressivo olhar, compõe a tragédia que cabe com perfeição à personagem da pobre menina afogada. David Pledger sai-se muito bem como Russell, o pai. Acreditamos no seu desempenho, e não há dúvida de que reconhecemos esse mesmo personagem de tantos outros filmes, ou mesmo da vida real: o pai correto, honrado, trabalhador e gentil que procura fazer o melhor para manter a família unida, dadas as circunstâncias. Steve Jodrell rouba o filme como Ray Kemeny. Os seus modos muito amenos, o olhar conhecedor, o compreensivo e resignado sorriso, os variados elementos da performance compõem o veterano de bom coração que entende como poucos as contradições da condição humana, e que portanto parece ser o único capaz de oferecer alguma paz à família em luto. Espero vê-los em muitos outros filmes!
Há dois tipos muito distintos de horror. Quando assistimos aos filmes do grande James Wan, que reúne as principais qualidades de um "jovem Steven Spielberg", podemos ficar assegurados que teremos duas horas de muitos sustos, algum humor para suavizar a tensão do "passeio de montanha russa", e, principalmente, mensagens positivas que reforçam o otimismo com que o cineasta enxerga o mundo e o potencial individual para o Bem. Quando assistimos (ou lemos) as obras de Clive Barker ou os filmes de Cronenberg, De Palma, Argento, Rob Zombie, quando assistimos a uma produção estilo "Session 9" ou "Hellraiser", o "passeio na montanha russa" segue um script imprevisível e muito diferente do que aquele oferecido por Wan. Estes trabalhos ficam conosco graças ao incomum impacto psicológico que pouquíssimos artistas conseguem canalizar, e ainda menos pessoas estão dispostas a "suportar". Se você procurar "divertir-se" assistindo a algo como "Lords of Salem", por exemplo, pode crer que tudo o que conseguirá será se sentir incomodado, desafiado e cheio de angústias. Ao final, porém, perceberá que mesmo tendo "sobrevivido" a duas horas de puro castigo psicológico, conferiu uma obra que te fez pensar, e ficará martelando a cabeça por um bom tempo. Não há entretenimento propriamente dito, mas sim um desafio, uma "montanha a ser transposta". Há uma satisfação incomum em se "sobreviver" a filmes tão psicologicamente densos e exigentes.
"O Segredo do Lago Mungo" cabe `a segunda categorização. Não tem muito a oferecer em termos de sustos ou entretenimento, mas é um filme sutil, tétrico e de atmosfera carregada e eletrizante, que estimula a pensar, e permanece conosco muito tempo após seu desfecho. "O Segredo do Lago Mungo" segue o estilo "mockumentary", ou seja, é apresentado como uma história real, um "documentário". Assistindo ao filme, não tive como deixar de me lembrar do extinto "Linha Direta", o programa que sempre trazia duas tristes histórias de crimes terríveis por episódio. Através de entrevistas com familiares, reconstituições e todos os demais expedientes jornalísticos, "Linha Direta" chegava a parecer, ao menos a meus olhos, mais incômodo do que os mais fantasiosos filmes de horror. Se vocês apreciam este estilo de story telling, "O Segredo do Lago Mungo" é uma pedida certa, quase como uma versão mais adulta e assustadora do "Linha Direta".
Ao longo de seus noventa minutos de projeção, há apenas uma única cena que te fará "saltar da cadeira". Acontece lá pelo terço final, e meio que "amarra" as pontas soltas da história, mesclando interessantes conceitos sobre morte, viagem no tempo e a propriedade de se enxergar, mesmo que por alguns segundos apenas, o que o destino nos reserva logo mais `a frente. Apesar de o filme contabilizar somente uma cena de franco susto e horror, todo o restante é permeado por uma sensação de aflição, tristeza e incômodo, gradualmente mais intensa `a medida que a presença muito sutil, sempre velada, do espírito da menina, vai se tornando mais perceptível, embasada por fotos e filmagens de deixar os cabelos da nuca eriçados. Tão marcante quanto a sugestão de um espírito insatisfeito procurando contatar a família para um último momento de desculpas e despedida, são as reviravoltas que tornam segredos muito humanos os maiores horrores dessa história "de fantasmas". Uma vez que o tape dos Toohey é exposto em toda sua crueldade, a alma de Alice deixa de se tornar a nossa principal preocupação, e vira um triste, quase inaudível grito do passado, um instante de dor, uma voz muito distante e sem forças que só evoca pena, e clama pela redenção e perdão dos pais. Mais intrigante que a sua alma entristecida, é o fato de ter sido secretamente apaixonada por Marissa ou Brett Toohey e sexualmente usada e manipulada, pela pouca idade ou falta de experiência quanto as maldades da vida.
Apesar de tortuoso e de difícil assimilação, o diretor conclui "O Segredo do Lago Mungo" com uma nota otimista. O amor de família é capaz de superar os mais temerosos segredos, e não há falta alguma capaz de eclipsar a maneira doce e amorosa com que os pais a enxergavam e com que continuarão a se recordar da filha. Eles a perdoam pelos seus deslizes, e se lembram de Alice pelos grandes, melhores momentos, diferente da maneira como nos comportamos, muitas vezes, em nossas vidas: tendemos a nos recordar de alguém pelo seu último momento, jamais pelo melhor momento. Tanto em relacionamentos amorosos quanto amizades, por mais que duas pessoas tragam o que há de mais valoroso uma da outra, quando ao fim, nada daquilo parece importar, restando somente a "parte má", pela qual passamos a associar seja quem for que tenha feito parte de nossa história. Neste filme, aprendemos que somos uma soma de momentos, não nos resumimos a um mau instante apenas, e que mais importante do que os deslizes, acabam por ser as grandes atitudes aquelas que realmente nos definem. Pelo fato de Alice ser uma jovem com tudo pela frente, quando no início se vai tão tragicamente, a morte nos acerta em cheio com a inconstância do destino. Percebemos que devemos abandonar o conceito preestabelecido de que estaremos garantidamente aqui por um bom tempo, e ter em mente que estamos aqui, isto sim, por um tempo bom. Precisamos fazer o melhor com os anos que nos são concedidos, muito ou pouco, buscando a felicidade, através do investimento pessoal, crescimento profissional, estudo, verdadeiras amizades, contribuindo para que os mais vulneráveis também tenham a mesma oportunidade de encontrá-la. Apesar de sermos o convidado principal para esta festa chamada vida, jamais sabemos quando vai se acabar. Talvez seja a transitoriedade de tudo que a torne tão espetacular, um presente que não se deve desperdiçar.A vida chega fácil, vai embora fácil.
Todos os direitos autorais reservados a Lionsgate. O uso do trailer é para efeito meramente ilustrativo da resenha.
Dez dias depois, portanto em janeiro de 2006, os parentes começam a perceber fatos estranhos dentro de casa. Barulhos chegam do telhado, às vezes do lado de fora, através das janelas. No quarto de Alice, gavetas parecem ser remexidas. Céticos, os Palmer pensam se tratar de ratos, porém mesmo após as devidas providências, continuam a ter as noites interrompidas por portas que repentinamente se fecham com força, e os usuais ruídos vindos do quarto da menina. Uma das amigas de June comenta que até chegar próximo à casa lhe causava uma sensação ruim, como se houvesse algo de errado com o lugar. June é atormentada por sonhos desagradáveis e muito reais, o mais terrível e recorrente aquele onde Alice regressa da represa, ainda pingando de encharcada, de pé ao lado da cama, silenciosa e aterrorizada, encarando-a. Quando fevereiro chega, os pesadelos se tornam tão frequentes que June passa a evitar o sono, e para se distrair, começa a fazer caminhadas pelo bairro, ficando fora por horas. June está tão confusa que começa a invadir as casas dos vizinhos, de madrugada, apenas por escapismo, para dormir em suas salas, e sentir-se inserida em uma outra realidade, absolvida de toda a dor. A seu turno, Russell, um talentoso arquiteto, mergulha no trabalho para sublimar a perda, o que chega a causar algum constrangimento entre os colegas de escritório, que não sabem como ajudá-lo.
Uma noite, em fevereiro, depois de voltar para casa, Russell está tomando solitariamente um cafezinho na cozinha, quando escuta o barulho vindo do quarto de Alice. Ao investigar, encontra a própria filha, `a escrivaninha, como se nada tivesse acontecido, distraída com alguma coisa. Quando a menina o vê, levanta-se e vai em direção ao pai, gritando "Saia, saia". Russell corre, assustado. Com a comoção, acorda esposa e filho, que o encontram aos prantos, no corredor. Mathew segue cada dia mais isolado e distanciado. Quando marcas estranhas começam a aparecer pelo corpo, os pais o levam ao médico, que o testa para todas as doenças possíveis e não chega `a conclusão alguma. Algum tempo depois, as marcas somem.
Mathew procura um cavalheiro que é profissional de imagens e fotografias, louco para aprender técnicas de manipulação de filme. O senhor o admite como uma espécie de estagiário, e logo o rapaz se prova de enorme valia. Pelos últimos quatro anos, como hobby, de três em três meses, Mathew costumava fotografar o quintal de casa, sempre do mesmo ângulo, capturando as mudanças ao longo do tempo, as colinas de Ararat ao fundo. Naquele ano de 2006 em particular, a foto registra um curioso fenômeno: de pé e mais próxima `a cerca, se você prestar muita atenção, enxergará uma menina que parece ser Alice. Depois de levar a imagem aos pais, os ânimos melhoram. A imagem da filha meio que reacende as esperanças dos Palmer. Simultaneamente, ao registrar em fotos a beleza do lugar, um cidadão de Ararat chamado Bob Smeet, `a passeio pela represa, acaba por capturar, da outra margem do lago, a imagem de uma garota de cabelos compridos, de pé, ao lado de um tronco. Os Palmer convencem-se de que Alice ainda está viva. Eles conseguem obter autorização para a exumação do corpo, para a realização de exame de DNA, de modo a comprovar se seria mesmo o corpo de Alice que tinham enterrado. Resultados comprovam que o DNA bate com o de Alice. Fica a pergunta "E as imagens nas fotos?".
A família continua a escutar barulhos pela madrugada. Mathew resolve preparar a casa com câmeras, de maneira a capturar o que está se sucedendo. O resultado das filmagens é perturbador: uma pessoa cruzando o enquadramento, deixando a sala em direção `a porta principal, aparecendo muito brevemente pelo corredor. June decide procurar pelos serviços de Ray Kemeny (Steve Jodrell, dando a performance excepcional do filme), um senhor conhecido pela habilidade em contatar os mortos. Kemeny tem um programa de rádio e é uma espécie de celebridade em Ararat. Os cidadãos têm ideias muito diferentes sobre sua pessoa, alguns o chamando de charlatão, outros certos de que Kemeny os ajudou como ninguém mais conseguiria. Ray é muito procurado por pessoas que perderam entes queridos, ou mesmo aquelas que estão para morrer e desejam um pouco de conforto quanto ao "outro lado". Kemeny tenta fazê-las entender que a morte não é um amargo fim, mas "o começo de algo novo". June faz uma consulta preliminar com Ray, que a hipnotiza. June se vê diante do próprio alpendre, a voz de Ray a orientando a entrar. June entra e encontra a sala vazia. Segue até ao quarto da filha, e encontra o seu tênis do lado de fora. June empurra a porta, e a encontra sentada na cadeira ao lado da cama. Em seu rosto, traz uma expressão muito triste.
June leva Ray para casa, e apesar de reticente, Russell o trata com educação e cordialidade. Os Palmer fazem uma oração com Ray, e Mathew deixa a câmera sobre o tripé, filmando o encontro. Kemeny não consegue contatar Alice, todavia é apenas no dia seguinte ao examinar a filmagem que o menino descobre a irmã, assistindo a tudo, triste e silenciosa, ao final do corredor. Os pais ficam abismados, pois o rosto é claramente o de Alice. Mesmo Ray reage com desconcerto, porque até então, apesar de lidar com o mundo espiritual, jamais vira um espírito com tamanha riqueza de detalhes. Com a ajuda do rapaz, Kemeny instala três câmeras permanentes, por ângulos apropriados a cobrir os principais cômodos da residência. `Aquela altura, os amigos dos Palmer, até mesmo a senhora da força policial de Ararat que acompanhou a família das buscas pelo corpo ao luto, nutrem sérias dúvidas quanto a intenção do investigador. Ainda assim, Ray traz `a unidade familiar algo semelhante a uma reconfortante amizade, e não custa a se tornarem unidos, Ray participando da festa de aniversário do rapaz, em julho do mesmo ano. As câmeras fazem novos registros fantásticos. Uma delas, colocada no quarto da menina morta, revela a imagem de Alice penteando-se diante do espelho. Os Palmer mal têm tempo de processar o ocorrido, pois antes de pensarem a respeito, nova reviravolta põe o caso de ponta cabeça.
Os Wither são um casal de Ararat. Eles estavam na represa em abril, no mesmo dia em que Bob Smeet capturou a foto do fantasma de Alice. Os Wither registraram os bons momentos `a beira da bonita represa. Meses depois, ao revisitarem as imagens, dão pela presença, ao fundo, do cavalheiro que fez a foto. Como cidadãos de Ararat, os Wither estavam a par de toda a questão a envolver os Palmer e a foto tirada `a beira da represa. Um pouco mais adiante, na fita de vídeo, os Wither percebem uma outra pessoa, da outra margem do lago. Após manipulação de brilho e contraste, o senhor Wither conclui que havia outro visitante, e que não era uma menina, tampouco um fantasma, mas o próprio Mathew Palmer.
Quando Bob Smeet tirou a foto, o que se pensava ser o fantasma de Alice não passava de Mathew, vestido com peruca e uma das roupas da irmã, para forjar a presença do espírito inquieto de Alice. Mathew também tinha amplo conhecimento de manipulação de imagens e fotografias. As filmagens e os retratos haviam sido adulterados pelo próprio garoto, que o fizera para dar alguma esperança `a família e, de certa forma, ajudá-los a sentir Alice novamente próximo. Mathew compreende que ao procurar ajudar, acabou por tornar as coisas piores para June, que acabou devastada e com as esperanças estraçalhadas.
Preocupados com o filho, os Palmer permitem que o menino acompanhe Ray em uma viagem de três dias para consultas em algumas das cidades mais próximas a Ararat. Ray se tornou uma espécie de "tio mais velho" camarada, com quem o rapaz se sente mais `a vontade para se abrir. Apesar de muitas pessoas terem reserva quanto a natureza do trabalho de Ray, ele é essencialmente um homem de bem. Durante a viagem, até pelo tipo de trabalho de Kemeny, Mathew percebe o quanto sente falta da irmã morta. Ele finalmente está se permitindo enfrentar os estágios iniciais do luto. Antes de partir para a estrada com Ray, Mathew deixa novas câmeras ligadas, comprometendo-se com os pais a jamais adulterar as imagens novamente. Ao retornar para Ararat, em 22 de agosto, o rapaz checa os tapes, e para o choque de todos, captura uma verdadeira presença dentro da casa e ao longo dos corredores. Pela primeira vez, os Palmer veem um registro muito autêntico do que parecer ser o espírito da menina afogada. A novidade inspira os Palmer a revisitar os velhos tapes. É claro que agora sabem que muita coisa foi manipulada por Mathew, mas com a ajuda do filho, buscam filtrar algo que talvez não tenham percebido anteriormente. E eles tinham razão, pois em uma fita de julho, ao reverem a imagem de uma figura passando ao final do corredor, e Mathew deixar claro que não se trata de efeito adicionado, percebem que algo ou alguém de fato vinha rondando a casa. Trata-se de uma pessoa autêntica, "dando uma volta" pela residência dos Palmer, em plena madrugada. Com muito horror, June reconhece no invasor a fisionomia de Brett Toohey, o vizinho. "O que esse homem está fazendo na minha casa, no quarto da Alice, mais de seis meses após a sua morte?", é a pergunta de June. A mãe vasculha o quarto da garota, em busca de respostas, e as encontra, na forma da maleta da filha, onde escondia o diário e uma misteriosa fita de vídeo. O conteúdo da fita mostra uma realidade que os Palmer jamais poderiam imaginar.
Os Toohey eram velhos conhecidos e amigos da família Palmer. Alice costumava tomar conta dos dois menininhos, de cinco e nove anos, filhos do jovem casal, desde 2002, um trabalho que manteve pelos dois anos e seis meses seguintes, ou seja, muito próximo `a época do afogamento na represa. Não havia nada no comportamento do casal, cidadãos acima de qualquer suspeita, que sugerisse o segredo imundo revelado pelas imagens da fita. Os jovens do bairro lembram-se dos Toohey como "pessoas legais", que estavam sempre promovendo churrascos `a beira da piscina e se comportando de maneira jovial e gentil. Em uma das cenas mais fortes do filme, o conteúdo do tape é exibido: vemos Alice ligeiramente "alegre" (bêbada), após a festa, conversando em cima da cama com a mulher. Em seguida, chega o homem, que havia deixado a filmadora no tripé, preparada para gravar o encontro. Ele diz "Estou vendo que começaram sem mim". Inicialmente, não compreendemos do que está falando, mas então no frame seguinte, estão todos sem roupas agarrando-se, Alice praticamente "devorada" pelo casal, em uma cena que apesar de não mostrar muito graças `a qualidade da fita guarda força em seu inegável poder da sugestão, quando são o choro e a inércia da garota, devassada na cama pelos Toohey, que mais tornam o segmento uma revelação aterrorizante, perturbadora e memorável. Em uma fração de segundo, escutamos um gemido semelhante a uma risadinha, ou a um choro, vindo de Alice, e o mais perturbador é jamais sabermos do que se tratou.
"Por que vocês acham que Alice guardou o tape?", o entrevistador pergunta, e Russell responde, sem vacilar, "Porque ela não queria que eles o tivessem". Na opinião dos pais, Alice vinha mantendo encontros sexuais com o casal porque talvez tivesse se apaixonado por um dos dois, o homem ou a mulher. Eventualmente, despertou para o fato de que os Toohey estavam, em última análise, usando-a psicológica e fisicamente, e que o seu único trunfo residia na fita de vídeo. Foi por isso que os Palmer escutavam os barulhos vindos do quarto de Alice, de madrugada, logo após a morte: Brett Toohey estava desesperado para descobrir onde a menina deixara o VHS, pois sabia que se os Palmer descobrissem, ele e a esposa estariam em maus lençóis com a Lei. Até onde sabiam, tinham cometido estupro, pouco importando o consentimento de Alice, menor de idade à época do início dos encontros sexuais. O fato de a menina ter somente quinze anos quando do começo das "sessões" já consistia prova suficiente para o crime de estupro. Brett e Marissa Toohey se mudaram de Ararat seis meses após a morte de Alice, e quando o tape é encontrado pelos Palmer, não há muito a fazer.
Há mais uma surpresa. Ao folhear o diário de Alice, June encontra o cartão de Ray Kemeny: a menina o procurara pouco antes da morte para uma consulta, e Ray jamais revelara o encontro aos Palmer. A data no diário aponta para julho de 2005, praticamente um semestre antes do afogamento na represa. Na fita da consulta, vemos Alice e Ray `a mesa, conversando. Alice pergunta se Kemeny consegue interpretar sonhos, pois vem tendo pesadelos terríveis. Ray conduz uma sessão de relaxamento & hipnose, e pede para que se concentre e feche os olhos. Ele a instrui a se imaginar no jardim de casa, e é isso que Alice faz. Ele pede para que abra a porta, entre tranquilamente pelo alpendre, e lhe diga o que vê e sente enquanto adentra na residência. Ray explica que quando foi procurado pelos Palmer não contou sobre a sessão por uma questão de sigilo profissional. Ele queria ajudar a família, e acreditava que se tivesse avisado que a menina requisitara seus serviços, estaria apenas atrapalhando a missão de conduzi-los através do luto. June diz que depois da descoberta, perdeu a confiança em Kemeny. A família rompe contato com o psíquico. Ray atribui o ressentimento ao fato de não ter conseguido prever a morte da menina, dali a cinco meses no futuro.
No diário, novos indícios de que de alguma maneira a menina pressentia a própria morte. June lê um trecho muito perturbador "Tive um sonho ontem `a noite. Estava molhada e com frio. Sentia-me pesada, como se tivesse sido drogada, e quando acordei, a sensação não desapareceu. Sentia-me enjoada e confusa, e estava começando a me assustar, precisava ver mamãe, para conversar com ela. Cambaleei até a seu quarto, e enquanto estava de pé a seu lado, observando-a, fui assaltada por uma intensa tristeza, que se tornou medo, quando percebi que não havia nada que meus pais pudessem fazer por mim. Nunca me senti tão só na vida. Tudo parecia errado: meu corpo, a maneira como as coisas pareciam. Então compreendi que havia algo de errado comigo. Comecei a chorar, ao pé da cama".
A menina ocupou uma folha inteira do diário com menções a "Lago Mungo", uma enorme paisagem desertificada que de muitas maneiras se assemelha a uma infindável praia, situada no sudeste de New South Wales. Alice esteve em "Lago Mungo" com as amigas do colégio, em uma excursão, dos dias 2 a 5 de agosto de 2005. Segundo June, quando a filha voltou para casa, parecia feliz, afirmando que tinha se divertido bastante, apesar de ter perdido o celular, o bracelete e o relógio. Kim, a melhor amiga de Alice, fez registros com o celular da noite do dia 05, no "Lago Mungo". Ela e o ex-namorado de Alice procuram pelos Palmer para exibir as imagens de Kim. Não há nada de incomum, no entanto, nas imagens, Alice parece definitivamente angustiada, e é vista enterrando um invólucro que contém celular, bracelete e relógio. Algo nas imagens convence os Palmer a visitar o "Lago Mungo". Os pais precisam saber o que incomodara a menina a ponto de ter enterrado as próprias coisas nas dunas.
Estamos em fevereiro de 2007. Os Palmer visitam o "Lago Mungo", e começam a cavar pelas dunas. Quando menos espera, June encontra o saco plástico onde Alice escondera as posses. É quando a família vai averiguar as imagens feitas no celular que encontra uma imagem assombrosa (o mais eletrizante momento do filme, uma das cenas mais perturbadoras já levadas `as telas). A filmagem daquela noite, anos atrás, começa de maneira inocente, Alice passeando solitariamente pela imensidão entre dunas, as amigas brincando em algum outro lugar. Alice começa a se aproximar de uma figura que está parada mais à frente, aparentemente uma menina da excursão. `A medida que se aproxima, Alice vai revelando melhor a natureza da "visitante": o que está vendo é a si mesma, morta, afogada, com a mesma expressão com que seu cadáver seria de fato retirado da represa. Alice filma o seu próprio fantasma, portanto, vindo do futuro, provavelmente para lhe avisar que a morte estava chegando. Apesar de breve, a cena faz o coração saltar pela boca, um grande triunfo do diretor, que construiu todo o filme em torno deste único instante, cuja força, mesmo seis anos após o lançamento, parece incomparável. Ao assistir `as intrigantes imagens, os Palmer finalmente encontram a resolução para os mistérios que revolviam a morte de Alice. Quando a menina enterrou o celular, o bracelete e o relógio, fê-lo simbolicamente, certa de que a morte estava para ocorrer dali a alguns meses. Alice sabia que ia morrer, apenas não quando, e queria deixar o material para trás, para que um dia, talvez, os pais o desenterrassem.
Em um curto espaço de tempo, os Palmer descobriram o que se sucedeu `a filha nos braços de Marissa Toohey, o segredo da consulta com Ray Kemeny e a filmagem misteriosa em "Lago Mungo". Quando retornam para Ararat, sentem-se emocionalmente exaustos, porém felizes. Pela primeira vez, a casa lhes parece diferente, mais suave e arejada. June diz que a filha finalmente retomou a jornada rumo à eternidade, em paz com o fato de os pais terem descoberto seu mais inconfessável segredo, e ainda assim, amarem-na incondicionalmente. Não demora aos Palmer começarem a se sentir novamente uma unidade familiar e retornar a suas vidas de onde as haviam deixado. Seis meses se passam, até que Ray liga para os Palmer, e avisa que estará passando por Ararat pelos próximos dias, a trabalho. A família meio que superou os ressentimentos, e aceita reencontrá-lo. Eles o recebem muito bem, retomando a amizade, sem qualquer tipo de mágoa. Nós os vemos fazendo um piquenique juntos.
Decididos a seguir em frente, o próximo natural passo é vender a casa e procurar por um novo lugar para recomeçar. Os Palmer fazem uma animada festa de despedida, e os ânimos parecem ótimos. O filme conclui com uma última consulta psíquica de June com Ray. Nesta cena, o diretor Joel Anderson contrapõe dois momentos muito distintos: assistimos `a última consulta de June com Ray, entrecortada pela consulta de Alice, quando viva. Concentrada, June "entra na casa" e chega `a porta do quarto da filha. Ela abre a porta, encontra o quarto muito bem arrumado. June diz que Alice não está mais lá. Simultaneamente, o diretor Anderson nos remete `a consulta de Alice com Ray. Na consulta, feita um ano antes, a menina também foi submetida à hipnose, e estava "visitando a casa". Ao contrário de June, porém, que nada viu, Alice diz a Kemeny que enxerga a mãe, e que ela parece não se dar pela sua presença. Alice inclusive a vê deixando o quarto, tranquilamente. Este momento nos mostra que o amor de mãe e filha foi tão espetacular que as duas tiveram como dobrar espaço e tempo, mesmo por um ínfimo momento, para encontrar-se em um mesmo lugar, graças `a ajuda de Ray. Todos estão em paz. Agora, Alice pode seguir em sua jornada em direção `a luz, e os Palmer, fazer de suas vidas o melhor possível, a dor da tragédia definitivamente superada, substituída pela doçura das recordações de dias mais felizes.
Nos créditos finais, o diretor Anderson exibe novamente as imagens manipuladas por Mathew. Desta vez, aprendemos que muito embora o menino tenha acrescentado a irmã em algumas das filmagens, em todos aqueles momentos, o verdadeiro fantasma da menina sempre estivera presente. Anderson nos mostra com um destaque circular as vezes em que o real espírito atormentado de Alice aparecera para pedir ajuda, em uma montagem arrepiante que nos mostra que desde o começo, a menina afogada estivera entre os entes queridos, que haviam se distraído com as montagens de Mathew, quando de fato tentava se comunicar.
Lançado com pouco alarde em 2008, não custou a "Lake Mungo", um surpreendente, psicologicamente enriquecido ensaio sobre as consequências da morte em família e do luto, ganhar a atenção de público e crítica nos festivais de cinema especializados em Horror. O suspense, dirigido pelo novato Joel Anderson, chegou aos Estados Unidos em 2010, no conceituado After Dark Horrorfest, que sempre nos traz extraordinárias novidades do cinema independente, tais como "Dread", adaptação do conto de Clive Barker, e "Mulberry Street", mas já havia feito fama anteriormente, em importantes competições em Sydney, na Austrália, e no Reino Unido. Há alguns anos, os produtores da refilmagem de "O Chamado" compraram os direitos sobre o enredo original, todavia o novo filme jamais deixou o papel. Uma vez que se esteja familiarizado com a trama, parece compreensível por que a refilmagem jamais saiu das fases muito iniciais de concepção.
É difícil imaginar que um remake consiga capturar a magia do original. Visualmente, o filme é um esplendor, mas isso não é mérito exclusivo do talentoso diretor de fotografia John Brawley. O deslumbre se deve a uma de suas grandes estrelas, a encantadora Austrália. Brawley pincela noites e madrugadas com um azul aquoso, místico e nostálgico, e captura o espaço com lentes de ângulos bem abertos, para nos dar uma ideia da envergadura do outback australiano. As cidadezinhas são lindas e tranquilas, ruas muito espaçadas, igrejas e comércios que evocam um saboroso sentimento de familiaridade, de se viver em comunidade e se estar em casa. Ao mesmo tempo, há um sabor de "road movie" pela maneira como o diretor Joel Anderson filma auto estradas e colinas, sempre ao fundo. "O Segredo do Lago Mungo" é um dos filmes mais esteticamente lindos que já vi, e se levarmos em conta o pequeno orçamento que a equipe teve para contar a história, renderemos a devida homenagem a esses espetaculares profissionais, os diretores de fotografia, os homens que dão o tom correto`as fantasias. Até o momento, "O Segredo do Lago Mungo" é o momento profissional mais destacado da carreira do Sr. John Brawley, mas pelo seu olhar romântico e nostálgico, afirmo sem titubear que o seu nome merece figurar ao lado do de Morten Soborg como um dos gigantes de seu ofício.
As performances também são espetaculares, e fui pego de surpresa por não reconhecer nenhum destes maravilhosos atores australianos. Talia Zucker oferece algo de soturno e misterioso com sua beleza diferenciada, uma melancolia muito semelhante à de Selma Blair, por exemplo. Com o expressivo olhar, compõe a tragédia que cabe com perfeição à personagem da pobre menina afogada. David Pledger sai-se muito bem como Russell, o pai. Acreditamos no seu desempenho, e não há dúvida de que reconhecemos esse mesmo personagem de tantos outros filmes, ou mesmo da vida real: o pai correto, honrado, trabalhador e gentil que procura fazer o melhor para manter a família unida, dadas as circunstâncias. Steve Jodrell rouba o filme como Ray Kemeny. Os seus modos muito amenos, o olhar conhecedor, o compreensivo e resignado sorriso, os variados elementos da performance compõem o veterano de bom coração que entende como poucos as contradições da condição humana, e que portanto parece ser o único capaz de oferecer alguma paz à família em luto. Espero vê-los em muitos outros filmes!
Há dois tipos muito distintos de horror. Quando assistimos aos filmes do grande James Wan, que reúne as principais qualidades de um "jovem Steven Spielberg", podemos ficar assegurados que teremos duas horas de muitos sustos, algum humor para suavizar a tensão do "passeio de montanha russa", e, principalmente, mensagens positivas que reforçam o otimismo com que o cineasta enxerga o mundo e o potencial individual para o Bem. Quando assistimos (ou lemos) as obras de Clive Barker ou os filmes de Cronenberg, De Palma, Argento, Rob Zombie, quando assistimos a uma produção estilo "Session 9" ou "Hellraiser", o "passeio na montanha russa" segue um script imprevisível e muito diferente do que aquele oferecido por Wan. Estes trabalhos ficam conosco graças ao incomum impacto psicológico que pouquíssimos artistas conseguem canalizar, e ainda menos pessoas estão dispostas a "suportar". Se você procurar "divertir-se" assistindo a algo como "Lords of Salem", por exemplo, pode crer que tudo o que conseguirá será se sentir incomodado, desafiado e cheio de angústias. Ao final, porém, perceberá que mesmo tendo "sobrevivido" a duas horas de puro castigo psicológico, conferiu uma obra que te fez pensar, e ficará martelando a cabeça por um bom tempo. Não há entretenimento propriamente dito, mas sim um desafio, uma "montanha a ser transposta". Há uma satisfação incomum em se "sobreviver" a filmes tão psicologicamente densos e exigentes.
"O Segredo do Lago Mungo" cabe `a segunda categorização. Não tem muito a oferecer em termos de sustos ou entretenimento, mas é um filme sutil, tétrico e de atmosfera carregada e eletrizante, que estimula a pensar, e permanece conosco muito tempo após seu desfecho. "O Segredo do Lago Mungo" segue o estilo "mockumentary", ou seja, é apresentado como uma história real, um "documentário". Assistindo ao filme, não tive como deixar de me lembrar do extinto "Linha Direta", o programa que sempre trazia duas tristes histórias de crimes terríveis por episódio. Através de entrevistas com familiares, reconstituições e todos os demais expedientes jornalísticos, "Linha Direta" chegava a parecer, ao menos a meus olhos, mais incômodo do que os mais fantasiosos filmes de horror. Se vocês apreciam este estilo de story telling, "O Segredo do Lago Mungo" é uma pedida certa, quase como uma versão mais adulta e assustadora do "Linha Direta".
Ao longo de seus noventa minutos de projeção, há apenas uma única cena que te fará "saltar da cadeira". Acontece lá pelo terço final, e meio que "amarra" as pontas soltas da história, mesclando interessantes conceitos sobre morte, viagem no tempo e a propriedade de se enxergar, mesmo que por alguns segundos apenas, o que o destino nos reserva logo mais `a frente. Apesar de o filme contabilizar somente uma cena de franco susto e horror, todo o restante é permeado por uma sensação de aflição, tristeza e incômodo, gradualmente mais intensa `a medida que a presença muito sutil, sempre velada, do espírito da menina, vai se tornando mais perceptível, embasada por fotos e filmagens de deixar os cabelos da nuca eriçados. Tão marcante quanto a sugestão de um espírito insatisfeito procurando contatar a família para um último momento de desculpas e despedida, são as reviravoltas que tornam segredos muito humanos os maiores horrores dessa história "de fantasmas". Uma vez que o tape dos Toohey é exposto em toda sua crueldade, a alma de Alice deixa de se tornar a nossa principal preocupação, e vira um triste, quase inaudível grito do passado, um instante de dor, uma voz muito distante e sem forças que só evoca pena, e clama pela redenção e perdão dos pais. Mais intrigante que a sua alma entristecida, é o fato de ter sido secretamente apaixonada por Marissa ou Brett Toohey e sexualmente usada e manipulada, pela pouca idade ou falta de experiência quanto as maldades da vida.
Apesar de tortuoso e de difícil assimilação, o diretor conclui "O Segredo do Lago Mungo" com uma nota otimista. O amor de família é capaz de superar os mais temerosos segredos, e não há falta alguma capaz de eclipsar a maneira doce e amorosa com que os pais a enxergavam e com que continuarão a se recordar da filha. Eles a perdoam pelos seus deslizes, e se lembram de Alice pelos grandes, melhores momentos, diferente da maneira como nos comportamos, muitas vezes, em nossas vidas: tendemos a nos recordar de alguém pelo seu último momento, jamais pelo melhor momento. Tanto em relacionamentos amorosos quanto amizades, por mais que duas pessoas tragam o que há de mais valoroso uma da outra, quando ao fim, nada daquilo parece importar, restando somente a "parte má", pela qual passamos a associar seja quem for que tenha feito parte de nossa história. Neste filme, aprendemos que somos uma soma de momentos, não nos resumimos a um mau instante apenas, e que mais importante do que os deslizes, acabam por ser as grandes atitudes aquelas que realmente nos definem. Pelo fato de Alice ser uma jovem com tudo pela frente, quando no início se vai tão tragicamente, a morte nos acerta em cheio com a inconstância do destino. Percebemos que devemos abandonar o conceito preestabelecido de que estaremos garantidamente aqui por um bom tempo, e ter em mente que estamos aqui, isto sim, por um tempo bom. Precisamos fazer o melhor com os anos que nos são concedidos, muito ou pouco, buscando a felicidade, através do investimento pessoal, crescimento profissional, estudo, verdadeiras amizades, contribuindo para que os mais vulneráveis também tenham a mesma oportunidade de encontrá-la. Apesar de sermos o convidado principal para esta festa chamada vida, jamais sabemos quando vai se acabar. Talvez seja a transitoriedade de tudo que a torne tão espetacular, um presente que não se deve desperdiçar.A vida chega fácil, vai embora fácil.
Filme sinistro com roteiro genial. Vale muito a pena assistir !
ResponderExcluirObrigado pelo comentário. Peço desculpas pela demora em publicá-lo, só hoje fui vê-lo entre outros que esperavam aprovação. Eu não os tinha visto antes. Grato pelas palavras.
ExcluirOnde posso assistir? Nunca acho ele disponível
ResponderExcluirEste filme pode ser baixado em torrent. Embora seja um filme relativamente obscuro, ele é facilmente rastreável em sites de torrent. Um filme muito bom.
ExcluirEsse filme é ótimo um dos melhores que já assistir valeu muito a pena ⭐⭐⭐⭐⭐⭐⭐⭐⭐⭐⭐⭐⭐
ResponderExcluir