O
filme então volta 17 horas atrás, antes da confusão, para nos apresentar
aos protagonistas desta aventura, os Dwyer, a família norte-americana composta pelos pais Jack & Annie (Owen WIlson & Lake Bell) e as meninas Lucy & Beeze (Sterling Jerins & Claire Geare). Eles encaram um voo intercontinental de quase 11 horas em direção ao país onde planos para uma gravíssima revolução são urdidos na surdina. Jack & Annie são jovens pais, e a dinâmica entre os dois me faz pensar nos personagens de Louis & Rachel Creed de "Pet Sematary": aos 30 e poucos, aprendem ao longo do caminho a serem bons pais enquanto cuidam de manter a chama da paixão avivada. Aprendemos que Jack é um importante engenheiro da multinacional Cardiff, tendo realocado a família para o país por tempo indeterminado até a conclusão das obras da barragem. Ao perder a boneca, uma das meninas a recebe das mãos do cavalheiro sentado no assento detrás, um britânico chamado Hammond (Pierce Brosnan, dando o desempenho excepcional deste maravilhoso filme, em um de seus melhores papéis nos últimos anos). Ao chegarem ao aeroporto, Hammond lhes oferece uma carona, afinal de contas se hospedarão no mesmo hotel, o Imperial Lotus. Eles se conhecem melhor. Hammond ama aquela exótica parte do mundo, já a tendo visitado 15 vezes anteriormente. O britânico sente-se meio protetor em relação aos norte-americanos, porque sabe que como turistas "verdes" que jamais andaram por aquele lugar, tendem a ser explorados por taxistas e malandros locais. Hammond os apresenta a seu divertido amigo motorista, que aparece dirigindo um ônibus jardineira caindo aos pedaços. Ao proferir o nome quando se apresenta aos americanos, ele deixa Jack confuso com a extensão do mesmo, mas o rapaz avisa que se preferir pode chamá-lo de "Kenny Rogers". Isso mesmo, o rapaz é fã do cantor Kenny Rogers, e sua jardineira foi caracterizada como um pequeno altar para o astro americano! O percurso do aeroporto ao hotel é uma grande brincadeira, Hammond & Kenny Rogers arranhando grandes sucessos do astro da música, Jack & Annie trocando olhares assustados ao sabor do sacolejo da jardineira, todos em ótimos espíritos. Nesta cena - a chegada da turma à noite, a jardineira atravessando as ruas daquele lugar cuja noite sempre parece fervilhante - o filme evoca a atmosfera de um outro intrigante suspense ambientado na Tailândia, "Only God Forgives", estrelado por Ryan Gosling. Apesar de jamais nominar explicitamente o país onde a trama de "Horas de Desespero" se desenrola, a todo tempo o diretor evoca o mesmo tipo de sentimento - vidas marginais expostas em paralelo ao movimento de turistas, cultura exótica, luzes de neon - de "Only God Forgives", este sim passado na Tailândia. Durante o passeio em direção ao hotel, Jack & Annie acham esquisito quando ao passarem próximo ao Palácio Presidencial enxergam uma certa inquietação, movimentação. Decerto, naquele exato ponto da noite, observava-se o primeiro assalto dos guerrilheiros ao governo, conforme visto na sequência que abriu o filme.
No lobby, o cerimonial do hotel organizou as boas vindas aos engenheiros da construtora Cardiff. A construção da barragem é uma grande novidade, todos os cidadãos sabem sobre a visita dos americanos à capital. Jack & Annie se "aclimatam" ao quarto de hotel. Para Lucy & Beeze, nem parece que realizaram uma viagem tão cansativa e demorada, parecem cheias de energia. Jack estranha quando ao tentar sintonizar um canal, não há sinal. O telefone também não funciona. Ao reportar os problemas na recepção, o rapaz explica que de uma hora para a outra a cidade inteira se viu sem linhas telefônicas ou sinais de celular ou TV. Não se sabe ainda a natureza do problema. Evidentemente, temos conhecimento do drama a se suceder no Palácio Presidencial, mas nenhum civil antevê ainda a revolução em vias de explodir.
Jack dá uma passada no bar do lounge. Hammond está "um pouquinho alto" depois de algumas doses de Whisky, ensaiando músicas no karaokê, enquanto Kenny Rogers e algumas garotas bonitas aplaudem e riem sentados à mesa, todos metidos em uma gostosa descontração. Hammond e Jack conversam ao pé do bar, e aprendemos um pouco mais sobre os dois personagens. Embora não saibamos muito de Hammond ainda, ele parece um homem com um passado triste. Ao ser questionado sobre filhos, ele explica que não os tem mais. Teriam os filhos morridos? A mulher foi embora e os carregou consigo? A seu turno, Jack revela que goza de uma enorme envergadura na Cardiff: ele inventou uma excelente válvula, a ser testada nas obras de barragem, e finalmente parece ter encontrado o sucesso, principalmente após ter sentido na pele a dor do fracasso quando a última empresa em que trabalhou faliu. Eles se despedem, Hammond animado para curtir a noite. Aqui, há um discreto, magnífico instante, espécie de presságio do terror por vir, quando Jack, pensativo no bar para acabar o chope solitariamente e voltar ao quarto, presta atenção em um inocente, pueril brinquedo da fonte, um bonequinho de madeira a perenemente girar a manivela de um poço d'água em miniatura, enquanto a água flui incessante. Ao fundo, o brinquedo produz um barulho semelhante ao do tique-taque de um relógio, que poderíamos associar a uma bomba prestes a ser deflagrada. Jack parece pressentir algo de terrível, no entanto volta à suíte e afasta pensamentos tão absurdos da mente.
Durante a madrugada, desperta com o ruflar semelhante ao de trovões. Checa pela janela, e nada encontra. Mal imagina que se trata de uma explosão distante. Ele encontra a esposa sentada no banheiro, chorosa. Ele a compreende: a viagem significa uma grande mudança de vida, deixaram a América por um outro lugar cuja língua ou cultura sequer compreendem bem. Ela não responsabiliza o marido, apenas precisa extravasar a eletricidade emocional, e Jack respeita o espaço da esposa. Na manhã seguinte, ao procurar o rapaz da recepção, este novamente lhe avisa que não há recado dos executivos da Cardiff. Ao pedir por um jornal do dia, um novo fato estranho: os jornais não circularam naquela data. O rapaz o orienta a procurar por uma tabacaria no centro da cidade, onde decerto encontrará diários locais e internacionais.
Não há dúvidas que a capital é um paraíso turístico, e mesmo ao sair pelos pacatos jardins do Imperial Lotus para a caminhada, nada sinaliza que o lugar se tornou um inconstante barril de pólvora. No mercado central, há quiosques onde os comerciantes preparam os peixes e oferecem toda sorte de iguarias. Neste momento, "Horas de Desespero" nos remete ao excelente "Skin Trade", um filmaço de ação também ambientado na Tailândia, o lugar que para diretores de fotografia deve representar o paraíso, dadas as infinitas possibilidades e riqueza da cultura daquela gente de vida palpitante. Ele chega à tabacaria, mas no que se refere a jornais internacionais, os mais recentes datam de 3 dias atrás. Jack, que sofrera um interessante presságio na noite anterior, agora sabe que algo ainda invisível se encontra em curso nas ruas da capital.
Conforme esperava, ao caminhar intrigado pelas calçadas, é assaltado por uma cena horripilante: de uma das extremidades do quarteirão, marcha a tropa de choque, centenas de policiais militares vestidos com escudos e cassetetes. Vindos da outra, homens metidos em roupas de guerrilha, pedaços de pau em mãos, preparados para a revolução, avançam no sentido contrário. Como em uma paródia macabra das batalhas em "Coração Valente", as duas massas partem para o "mano a mano", enquanto Jack trata de correr para longe da concentração. Apesar de fortemente armados, os soldados da tropa de choque são atropelados. Correndo por vielas muito estreitas de uma favela, Jack consegue evadir-se e passar desapercebido. Ao longe, enxerga a marquise do Imperial Lotus Hotel, e tenta se guiar apenas visualmente. Quando se encontra a apenas algumas quadras, testemunha a execução sumária de um cavalheiro que embora se identifique como norte-americano, toma um tiro de execução na nuca. Não se sabem ainda as intenções dos guerrilheiros, no entanto é seguro afirmar que qualquer pessoa estrangeira flagrada pela revolução sofrerá o mesmo destino. Os revolucionários enxergam Jack, mas ele consegue ser mais rápido ao subir uma escada externa e entrar no Imperial Lotus Hotel ao quebrar uma janela. Ele se intromete bem no meio de uma apresentação no salão de conferências, as pessoas ainda alheias ao drama do lado de fora.
No lobby, os funcionários lacram o acesso ao interior e preparam barricadas, enquanto a horda de guerrilheiros bate nas portas para quebrar os vidros. Não custa a os guerrilheiros vencerem as barricadas, e invadirem de metralhadoras em punho, atirando. Jack passa o cartão no elevador (que só funciona com a identificação) e alcança o 8° andar. Na suíte, a esposa e uma das meninas, ainda ignorantes, vestem maiôs para tomar banho na piscina. Exasperado e molhado de suor, Jack procura colocar em poucas palavras o perigo que correm. Quando dá pela ausência de Lucy, o pai pergunta pela menina, e Beeze conta que a irmã se adiantou e já desceu para a área de lazer, que fica no 4° andar. Jack as orienta a fecharem as portas e aguardarem em silêncio, tratará de apanhar a menina. A caminho da piscina, ele enxerga por entre os corrimões os guerrilheiros pondo portas de quartos abaixo e fuzilando hóspedes, sem hesitação. De posse de um mapa do interior do complexo, que arranca da parede, Jack vai traçando um caminho através das áreas de serviço (cozinha, lavanderias, casa de máquina) em direção à piscina. No quarto, Annie veste roupas para a fuga, e calça a filha. Pelo olho mágico, testemunha a carnificina que os guerrilheiros cometem no apartamento da frente, armados com facões. Do quarto ao lado, chega o choro de uma mulher sendo impiedosamente estuprada.
Ao alcançar a piscina, Jack fica chocado ao se deparar com Lucy mergulhando e nadando como se nada tivesse acontecido. Distraída em seu próprio mundo, ela jamais teria pressentido o caos que se aproxima. O pai a pega pelos braços e a arranca d'água. Ele lança um olhar em direção ao lobby, onde os selvagens massacram os recepcionistas a golpes de porretes e foices. Quando avistam o americano e a menina pequena, correm para a área da piscina, mas Jack é mais rápido: ele usa uma boia para encerrar a passagem entre lobby e área de lazer, e empreende fuga com a criança. Jack sobe as escadas de serviço com Lucy, quando subitamente um guerrilheiro mascarado aparece à frente. Momentaneamente, tudo parece perdido, porém é Hammond quem aparece para salvar o dia: ele se lança sobre o bandido e o incapacita. Ordena que o americano suba à cobertura. Hammond esmaga a cabeça do vilão com a porta, e depois atira o corpo escada abaixo, atrapalhando os planos dos guerrilheiros que vinham no encalço de pai & filha bloqueando momentaneamente a passagem. No apartamento, Jack reencontra Annie & Beeze. As duas choram de alegria ao ver que eles conseguiram. Annie fala que devem permanecer no quarto, Jack retruca que eventualmente os bandidos conseguirão entrar. Se há uma salvação, só a encontrarão na cobertura com os demais sobreviventes. Eles ganham os corredores rumo às escadas de serviço. Por pouco não são alvejados por disparos de metralhadoras. A família atinge a cobertura, e os demais turistas sobreviventes, ali reunidos, encerram a passagem que dá para o telhado, isolando o caos abaixo. Por ora, os Dwyer estão a salvo.
As pessoas de bem reunidas naquele espaço procuram compreender a origem do caos reinante. Um cidadão com sotaque australiano orienta Jack a não se aproximar do parapeito, porque os guerrilheiros responderão com tiros. Um turista francês que entende a língua do país explica que os guerrilheiros entoam gritos de "Sangue por água". Inicialmente, ninguém compreende o sentido daquilo, contudo um recepcionista sobrevivente opina que provavelmente os guerrilheiros queiram se referir ao recente contrato entre a multinacional Cardiff e o Governo. Os guerrilheiros ficaram possessos, pois tomaram o acerto como uma afronta à soberania da nação. Eles derrubaram o governo movidos pelo inconformismo, e agora prometem executar qualquer estrangeiro dentro das fronteiras. Subitamente, o rumor de hélices indica que um helicóptero executa uma aproximação, e os sobreviventes comemoram, certos de que o resgate chegou. Quando o mesmo se torna mais nítido aos olhos das pessoas da cobertura, percebem não se tratar de uma Força de Resgate da ONU, e sim dos próprios rebeldes. Antes que os turistas consigam correr, um guerrilheiro a bordo saca a metralhadora e abre fogo, matando várias pessoas no processo. Jack, Annie e as meninas se abaixam bem a tempo de escapar da saraivada de tiros. O piloto executa uma manobra que dá ao atirador novos ângulos para disparos, e ele segue metralhando os turistas remanescentes. Em uma sequência de tirar o fôlego, possivelmente inspirada em "Cliffhanger", do diretor Renny Harlin, o piloto acidentalmente deixa que as pás da cauda se choquem contra a marquise do Imperial Lotus, perdendo o controle sobre o aparelho. O helicóptero entra em parafuso, caindo sobre a cobertura e quase avançando sobre Jack e família, que se protegem por trás de um pilar mais resistente.
Em uma das cenas mais aflitivas, Jack vê que eles foram encurralados na cobertura, pois os bandidos rompem a passagem de acesso. Só há uma chance: saltar para a cobertura seguinte, a cobertura de um prédio menor vizinho. A vista das ruas abaixo, a denunciar a altura a que se encontram, é de provocar vertigens. Annie salta primeiro, e rala os braços e joelhos ao cair na outra cobertura. Jack apanha a menorzinha e sem nada avisar para não deixá-la assustada, a atira no ar, de modo que Beeze cai nos braços da mãe. O grande susto se dá quando Jack vai arremessar a Lucy, que se segura ao pescoço do pai no último segundo e quase provoca a queda de ambos. O pai consegue acalmá-la, e então a joga com sucesso. O último a saltar é Jack. A salvo, ele ainda lança um olhar para o Imperial Lotus. Quem o está observando com ares de predador é o suposto líder do movimento, que exibe o cartaz deixado no lobby: ele sinaliza que sabe que Jack é um dos engenheiros da Cardiff, e que cedo ou tarde conseguirá alcançá-lo.
Pelas janelas do novo prédio, aparentemente uma repartição pública, Jack avista a chegada de um tanque de guerra. Um disparo contra a fachada quase o põe abaixo. Muitos funcionários públicos morrem instantaneamente. Jack reúne a esposa e as filhas e eles se escondem sob os cadáveres, de modo a se passarem por mortos. Ele vê quando soldados fazem o reconhecimento da sala e executam os funcionários ainda vivos. Jack e família permanecem silentes e imóveis até os homens partirem. Começa a escurecer. A sós na sala abandonada daquela repartição pública em um decadente prédio do centro, eles têm um doce momento, quando o pai procura encorajar as filhas. Annie encontra um mapa, ela sabe que devem alcançar a embaixada norte-americana o quanto antes. Ignorante quanto a língua, não faz ideia de onde se encontra a embaixada, mas uma das filhas aponta a bandeira norte-americana em um determinado ponto do mapa. Eles sabem para onde ir. Cauteloso, da sacada, Jack assiste `a cruel execução de prisioneiros de guerra enfileirados de joelhos na rua. Quando esperamos pelos disparos na nuca, na verdade é um caminhão dirigido pelos rebeldes que vem com toda a velocidade e os apanha em cheio, executando-os por atropelamento. As cenas de barbárie apenas se sucedem interminavelmente.
Um mercenário desarmado e mais jovem perambula pelos corredores e acaba indo parar na sala onde Jack e família se esconderam. Ele tenta gritar, porém o americano, agora tomado pela adrenalina, não hesita em matá-lo com duríssimos golpes de luminária na cabeça. Annie testemunha o massacre, chocada. A violência do marido, no entanto, justifica-se pelas terríveis circunstâncias em que se veem metidos. Jack recolhe roupas e se caracteriza como um dos guerrilheiros, tudo para passar despercebido. Esposa e filha também vestem roupas típicas da gente mais humilde da cidade. Friamente, o engenheiro encontra uma viela cheia de motocicletas de soldados, e mesmo entre "companheiros", consegue manter a tranquilidade para interpretar muito bem. Ele encontra uma moto, e mais distante, assovia à esposa e meninas para embarcarem. Faltam apenas alguns blocos até a embaixada. Transitando por vias desertas, a família testemunha a extensão do ataque. A estátua do Primeiro Ministro? derrubada. As lojinhas do centro? vandalizadas. Os hotéis turísticos? chamas os consomem em uma sequência de incêndios que sinalizam a anarquia completa e total ausência do Estado.
Jack dá uma passada no bar do lounge. Hammond está "um pouquinho alto" depois de algumas doses de Whisky, ensaiando músicas no karaokê, enquanto Kenny Rogers e algumas garotas bonitas aplaudem e riem sentados à mesa, todos metidos em uma gostosa descontração. Hammond e Jack conversam ao pé do bar, e aprendemos um pouco mais sobre os dois personagens. Embora não saibamos muito de Hammond ainda, ele parece um homem com um passado triste. Ao ser questionado sobre filhos, ele explica que não os tem mais. Teriam os filhos morridos? A mulher foi embora e os carregou consigo? A seu turno, Jack revela que goza de uma enorme envergadura na Cardiff: ele inventou uma excelente válvula, a ser testada nas obras de barragem, e finalmente parece ter encontrado o sucesso, principalmente após ter sentido na pele a dor do fracasso quando a última empresa em que trabalhou faliu. Eles se despedem, Hammond animado para curtir a noite. Aqui, há um discreto, magnífico instante, espécie de presságio do terror por vir, quando Jack, pensativo no bar para acabar o chope solitariamente e voltar ao quarto, presta atenção em um inocente, pueril brinquedo da fonte, um bonequinho de madeira a perenemente girar a manivela de um poço d'água em miniatura, enquanto a água flui incessante. Ao fundo, o brinquedo produz um barulho semelhante ao do tique-taque de um relógio, que poderíamos associar a uma bomba prestes a ser deflagrada. Jack parece pressentir algo de terrível, no entanto volta à suíte e afasta pensamentos tão absurdos da mente.
Durante a madrugada, desperta com o ruflar semelhante ao de trovões. Checa pela janela, e nada encontra. Mal imagina que se trata de uma explosão distante. Ele encontra a esposa sentada no banheiro, chorosa. Ele a compreende: a viagem significa uma grande mudança de vida, deixaram a América por um outro lugar cuja língua ou cultura sequer compreendem bem. Ela não responsabiliza o marido, apenas precisa extravasar a eletricidade emocional, e Jack respeita o espaço da esposa. Na manhã seguinte, ao procurar o rapaz da recepção, este novamente lhe avisa que não há recado dos executivos da Cardiff. Ao pedir por um jornal do dia, um novo fato estranho: os jornais não circularam naquela data. O rapaz o orienta a procurar por uma tabacaria no centro da cidade, onde decerto encontrará diários locais e internacionais.
Não há dúvidas que a capital é um paraíso turístico, e mesmo ao sair pelos pacatos jardins do Imperial Lotus para a caminhada, nada sinaliza que o lugar se tornou um inconstante barril de pólvora. No mercado central, há quiosques onde os comerciantes preparam os peixes e oferecem toda sorte de iguarias. Neste momento, "Horas de Desespero" nos remete ao excelente "Skin Trade", um filmaço de ação também ambientado na Tailândia, o lugar que para diretores de fotografia deve representar o paraíso, dadas as infinitas possibilidades e riqueza da cultura daquela gente de vida palpitante. Ele chega à tabacaria, mas no que se refere a jornais internacionais, os mais recentes datam de 3 dias atrás. Jack, que sofrera um interessante presságio na noite anterior, agora sabe que algo ainda invisível se encontra em curso nas ruas da capital.
Conforme esperava, ao caminhar intrigado pelas calçadas, é assaltado por uma cena horripilante: de uma das extremidades do quarteirão, marcha a tropa de choque, centenas de policiais militares vestidos com escudos e cassetetes. Vindos da outra, homens metidos em roupas de guerrilha, pedaços de pau em mãos, preparados para a revolução, avançam no sentido contrário. Como em uma paródia macabra das batalhas em "Coração Valente", as duas massas partem para o "mano a mano", enquanto Jack trata de correr para longe da concentração. Apesar de fortemente armados, os soldados da tropa de choque são atropelados. Correndo por vielas muito estreitas de uma favela, Jack consegue evadir-se e passar desapercebido. Ao longe, enxerga a marquise do Imperial Lotus Hotel, e tenta se guiar apenas visualmente. Quando se encontra a apenas algumas quadras, testemunha a execução sumária de um cavalheiro que embora se identifique como norte-americano, toma um tiro de execução na nuca. Não se sabem ainda as intenções dos guerrilheiros, no entanto é seguro afirmar que qualquer pessoa estrangeira flagrada pela revolução sofrerá o mesmo destino. Os revolucionários enxergam Jack, mas ele consegue ser mais rápido ao subir uma escada externa e entrar no Imperial Lotus Hotel ao quebrar uma janela. Ele se intromete bem no meio de uma apresentação no salão de conferências, as pessoas ainda alheias ao drama do lado de fora.
No lobby, os funcionários lacram o acesso ao interior e preparam barricadas, enquanto a horda de guerrilheiros bate nas portas para quebrar os vidros. Não custa a os guerrilheiros vencerem as barricadas, e invadirem de metralhadoras em punho, atirando. Jack passa o cartão no elevador (que só funciona com a identificação) e alcança o 8° andar. Na suíte, a esposa e uma das meninas, ainda ignorantes, vestem maiôs para tomar banho na piscina. Exasperado e molhado de suor, Jack procura colocar em poucas palavras o perigo que correm. Quando dá pela ausência de Lucy, o pai pergunta pela menina, e Beeze conta que a irmã se adiantou e já desceu para a área de lazer, que fica no 4° andar. Jack as orienta a fecharem as portas e aguardarem em silêncio, tratará de apanhar a menina. A caminho da piscina, ele enxerga por entre os corrimões os guerrilheiros pondo portas de quartos abaixo e fuzilando hóspedes, sem hesitação. De posse de um mapa do interior do complexo, que arranca da parede, Jack vai traçando um caminho através das áreas de serviço (cozinha, lavanderias, casa de máquina) em direção à piscina. No quarto, Annie veste roupas para a fuga, e calça a filha. Pelo olho mágico, testemunha a carnificina que os guerrilheiros cometem no apartamento da frente, armados com facões. Do quarto ao lado, chega o choro de uma mulher sendo impiedosamente estuprada.
Ao alcançar a piscina, Jack fica chocado ao se deparar com Lucy mergulhando e nadando como se nada tivesse acontecido. Distraída em seu próprio mundo, ela jamais teria pressentido o caos que se aproxima. O pai a pega pelos braços e a arranca d'água. Ele lança um olhar em direção ao lobby, onde os selvagens massacram os recepcionistas a golpes de porretes e foices. Quando avistam o americano e a menina pequena, correm para a área da piscina, mas Jack é mais rápido: ele usa uma boia para encerrar a passagem entre lobby e área de lazer, e empreende fuga com a criança. Jack sobe as escadas de serviço com Lucy, quando subitamente um guerrilheiro mascarado aparece à frente. Momentaneamente, tudo parece perdido, porém é Hammond quem aparece para salvar o dia: ele se lança sobre o bandido e o incapacita. Ordena que o americano suba à cobertura. Hammond esmaga a cabeça do vilão com a porta, e depois atira o corpo escada abaixo, atrapalhando os planos dos guerrilheiros que vinham no encalço de pai & filha bloqueando momentaneamente a passagem. No apartamento, Jack reencontra Annie & Beeze. As duas choram de alegria ao ver que eles conseguiram. Annie fala que devem permanecer no quarto, Jack retruca que eventualmente os bandidos conseguirão entrar. Se há uma salvação, só a encontrarão na cobertura com os demais sobreviventes. Eles ganham os corredores rumo às escadas de serviço. Por pouco não são alvejados por disparos de metralhadoras. A família atinge a cobertura, e os demais turistas sobreviventes, ali reunidos, encerram a passagem que dá para o telhado, isolando o caos abaixo. Por ora, os Dwyer estão a salvo.
As pessoas de bem reunidas naquele espaço procuram compreender a origem do caos reinante. Um cidadão com sotaque australiano orienta Jack a não se aproximar do parapeito, porque os guerrilheiros responderão com tiros. Um turista francês que entende a língua do país explica que os guerrilheiros entoam gritos de "Sangue por água". Inicialmente, ninguém compreende o sentido daquilo, contudo um recepcionista sobrevivente opina que provavelmente os guerrilheiros queiram se referir ao recente contrato entre a multinacional Cardiff e o Governo. Os guerrilheiros ficaram possessos, pois tomaram o acerto como uma afronta à soberania da nação. Eles derrubaram o governo movidos pelo inconformismo, e agora prometem executar qualquer estrangeiro dentro das fronteiras. Subitamente, o rumor de hélices indica que um helicóptero executa uma aproximação, e os sobreviventes comemoram, certos de que o resgate chegou. Quando o mesmo se torna mais nítido aos olhos das pessoas da cobertura, percebem não se tratar de uma Força de Resgate da ONU, e sim dos próprios rebeldes. Antes que os turistas consigam correr, um guerrilheiro a bordo saca a metralhadora e abre fogo, matando várias pessoas no processo. Jack, Annie e as meninas se abaixam bem a tempo de escapar da saraivada de tiros. O piloto executa uma manobra que dá ao atirador novos ângulos para disparos, e ele segue metralhando os turistas remanescentes. Em uma sequência de tirar o fôlego, possivelmente inspirada em "Cliffhanger", do diretor Renny Harlin, o piloto acidentalmente deixa que as pás da cauda se choquem contra a marquise do Imperial Lotus, perdendo o controle sobre o aparelho. O helicóptero entra em parafuso, caindo sobre a cobertura e quase avançando sobre Jack e família, que se protegem por trás de um pilar mais resistente.
Em uma das cenas mais aflitivas, Jack vê que eles foram encurralados na cobertura, pois os bandidos rompem a passagem de acesso. Só há uma chance: saltar para a cobertura seguinte, a cobertura de um prédio menor vizinho. A vista das ruas abaixo, a denunciar a altura a que se encontram, é de provocar vertigens. Annie salta primeiro, e rala os braços e joelhos ao cair na outra cobertura. Jack apanha a menorzinha e sem nada avisar para não deixá-la assustada, a atira no ar, de modo que Beeze cai nos braços da mãe. O grande susto se dá quando Jack vai arremessar a Lucy, que se segura ao pescoço do pai no último segundo e quase provoca a queda de ambos. O pai consegue acalmá-la, e então a joga com sucesso. O último a saltar é Jack. A salvo, ele ainda lança um olhar para o Imperial Lotus. Quem o está observando com ares de predador é o suposto líder do movimento, que exibe o cartaz deixado no lobby: ele sinaliza que sabe que Jack é um dos engenheiros da Cardiff, e que cedo ou tarde conseguirá alcançá-lo.
Pelas janelas do novo prédio, aparentemente uma repartição pública, Jack avista a chegada de um tanque de guerra. Um disparo contra a fachada quase o põe abaixo. Muitos funcionários públicos morrem instantaneamente. Jack reúne a esposa e as filhas e eles se escondem sob os cadáveres, de modo a se passarem por mortos. Ele vê quando soldados fazem o reconhecimento da sala e executam os funcionários ainda vivos. Jack e família permanecem silentes e imóveis até os homens partirem. Começa a escurecer. A sós na sala abandonada daquela repartição pública em um decadente prédio do centro, eles têm um doce momento, quando o pai procura encorajar as filhas. Annie encontra um mapa, ela sabe que devem alcançar a embaixada norte-americana o quanto antes. Ignorante quanto a língua, não faz ideia de onde se encontra a embaixada, mas uma das filhas aponta a bandeira norte-americana em um determinado ponto do mapa. Eles sabem para onde ir. Cauteloso, da sacada, Jack assiste `a cruel execução de prisioneiros de guerra enfileirados de joelhos na rua. Quando esperamos pelos disparos na nuca, na verdade é um caminhão dirigido pelos rebeldes que vem com toda a velocidade e os apanha em cheio, executando-os por atropelamento. As cenas de barbárie apenas se sucedem interminavelmente.
Um mercenário desarmado e mais jovem perambula pelos corredores e acaba indo parar na sala onde Jack e família se esconderam. Ele tenta gritar, porém o americano, agora tomado pela adrenalina, não hesita em matá-lo com duríssimos golpes de luminária na cabeça. Annie testemunha o massacre, chocada. A violência do marido, no entanto, justifica-se pelas terríveis circunstâncias em que se veem metidos. Jack recolhe roupas e se caracteriza como um dos guerrilheiros, tudo para passar despercebido. Esposa e filha também vestem roupas típicas da gente mais humilde da cidade. Friamente, o engenheiro encontra uma viela cheia de motocicletas de soldados, e mesmo entre "companheiros", consegue manter a tranquilidade para interpretar muito bem. Ele encontra uma moto, e mais distante, assovia à esposa e meninas para embarcarem. Faltam apenas alguns blocos até a embaixada. Transitando por vias desertas, a família testemunha a extensão do ataque. A estátua do Primeiro Ministro? derrubada. As lojinhas do centro? vandalizadas. Os hotéis turísticos? chamas os consomem em uma sequência de incêndios que sinalizam a anarquia completa e total ausência do Estado.
Em uma cena para deixar os nervos em frangalhos, quando poucas dezenas de metros os separam da embaixada, a família enxerga uma manada de guerrilheiros, todos celebrando alcoolizados, exibindo metralhadoras, atirando para cima. Annie quase tem um princípio de pânico, e quando barulhos semelhantes a disparos rasgam a rua, ela pede para que Jack dê meia volta e saiam dali. O marido, contudo, compreende a importância de "interpretar o papel" e não levantar suspeitas. Eles percebem que os barulhos vieram de fogos de artifício, e não tiros. Vão passando com a moto vagarosamente entre aqueles selvagens, que não lhes dispensam muita atenção, felizmente. Um jipe dirigido por revolucionários em marcha lenta arrasta os corpos horrivelmente mutilados de cidadãos estrangeiros. Os homens parecem desfilar com um boneco enorme vermelho de chifres, uma representação do Diabo. Há um instante memorável, quando Jack e a família perdem momentaneamente o equilíbrio, e um mercenário presta socorro, para levantar a moto. Eles trocam olhares, e o rapaz nota que os tênis, a cor dos olhos e cabelos do "companheiro" em nada se assemelham ao biotipo de um autêntico revolucionário. Ainda assim, o rapaz parece guardar suas opiniões para si. Jamais sabemos se ele deixou o pressentimento por menos, ou se realmente percebeu se tratar de uma família estrangeira, desesperada para sobreviver e chegar à embaixada, e portanto, por mais dedicado que fosse à causa, resolveu não denunciá-los aos comparsas, poupando-os da maldade coletiva.
A embaixada norte-americana "caiu". Os soldados americanos estão todos mortos, e o caos reinante indica que os rebeldes conquistaram o último bastião de esperança para os Dwyer. Um grupo de bandidos que deixa o prédio naquele exato momento enxerga Jack, e o teriam matado no ato, não fosse a explosão preparada pelos próprios guerrilheiros, que os faz se distraírem, permitindo que o americano fuja. Entre vielas de uma favela, eles chegam à porta de um idoso que aceita lhes dar guarida. Os mercenários não custam a chegar e a varrer o jardim com sinalizadores para descobrirem a família fugitiva. Eles dominam Jack & Annie. Para a mulher, eles têm estupro em mente. Quando estão para barbarizá-los, quem ressurge com muita comoção é Hammond. Ele dá uma de assustado, pede que não atirem, se comporta meio extravagante, e quando os guerrilheiros abaixam a guarda, o britânico saca a pistola e os acerta implacavelmente, tiros certeiros nas testas. Um dos "mercenários" que o ajudou a derrubar aqueles maníacos, que apenas fingia compor a horda, é seu melhor amigo Kenny Rogers. Ficamos felizes de ver a corja tomar aquilo que merece. Kenny Rogers avista de relance a um dos covardes empreendendo fuga. Puxa casualmente o rifle e o executa com um tiro certeiro. Jack e Annie se abraçam, emocionados, gratos pela chegada de Hammond & Kenny Rogers. Os americanos vocalizam a satisfação em vê-los, mas Hammond lhes lembra que não têm tempo para cenas emotivas. Eles precisam dar o fora dali! Quando Lucy começa a chorar, Hammond se agacha na frente da menina e reitera que não há tempo para lágrimas. Ele tira o pingente do pescoço e o coloca na criança. Hammond explica que fora a filha quem lhe dera o pingente, e dissera que enquanto o usasse, nada de ruim lhe ocorreria. Agora, Hammond repassa o amuleto da sorte à menina e lhe garante que nenhum mal recairá sobre sua pessoa ou aos pais.
Hammond os leva a um lugar semelhante a um prostíbulo. Apesar da decadência do local, o britânico se sente entre amigos. Ali, terão como descansar em paz. Ele os guia até uma caixa d'água que oferece uma vista mais ampla do rio. Hammond senta-se com as meninas ao redor de uma fogueira, onde Kenny Rogers assa uma galinha. Depois de pedir que as meninas se alimentem, o britânico chama Jack & Annie em um canto reservado para explicar o plano. Da caixa d'água, ele estende o braço em direção ao rio, prateado ao toque do luar. Se descerem o rio, eventualmente chegarão à fronteira com o Vietnã, onde certamente lhes darão guarida e os livrarão daquele inferno: os rebeldes não terão como lhes causar mal, não uma vez que se encontrem em território vietnamita. Hammond revela que não é apenas mais um turista afoito pela palpitante vida noturna daquele país asiático. Como agente secreto a serviço de Sua Majestade, sua função revolve se infiltrar em locais instáveis como aquele para estudar sua gente e cultura, e preparar terreno para a "invasão" de multinacionais americanas & europeias como a Cardiff. As construtoras chegam, constroem barragens & represas, o país não tem como pagar pela obra, e então o outro país invasor "se apropria" economicamente de interesses nacionais estratégicos. Os povos usualmente não percebem esse jogo de interesses, mas, por alguma razão, quando a Cardiff fechou o contrato com o Primeiro Ministro para instalar uma barragem, os cidadãos se revoltaram a ponto de derrubar o Governo e promover o Golpe de Estado. Jack não imaginava a política envolvida por trás da construção da barragem, e entre os demais envolvidos, parece o mais inocente. Hammond aconselha o pai de família a dormir, pois estarão partindo dentro de 4 horas. Jack e Annie não conseguem relaxar, mas têm um pouco de paz para conversarem. Ele a agradece por tê-lo apoiado ao longo de todos aqueles anos. Annie responde que não se arrepende da devoção à família, e que sem Jack, jamais teria sido mãe daquelas meninas a quem tanto ama.
Quando Jack e Annie finalmente pegam no sono, o americano desperta horas mais tarde ao escutar Hammond e Kenny Rogers à espreita da sacada. Eles sinalizam que não faça barulho, mas então alguém começa a atirar na caixa d'água, acordando Annie e as crianças. Hammond explica que há 4 atiradores em uma torre de observação, e que precisam deixar a caixa d'água e ganhar o caminho para o rio para a arrancada final rumo à fronteira com o Vietnã. Kenny Rogers é atingido na cabeça, porém Hammond põe o vilão abaixo com um tiro na testa. Outro bandido acerta um disparo no lado do britânico, mas ele mantém a compostura, e mesmo à distância estoura seus miolos. Eles alcançam a rua, e certo de que não conseguirá escapar com os americanos, Hammond recusa a ajuda de Jack. A família quer arrastá-lo dali com vida, porém Hammond prefere que escapem sozinhos. Quando um caminhão aponta no começo da rua e sinaliza que investirá à toda velocidade contra os sobreviventes, Hammond tem uma atitude de impressionante valentia e nobreza ao se colocar bem no meio da via, ficar na trajetória, apontar a pistola e fuzilar o motorista. O disparo vara a testa do bandido, e o caminhão capota e explode. Com o seu sacrifício, Hammond livrou o caminho dos Dwyer até o rio. Tragicamente, conforme explicara para Lucy, quando a filha lhe dera o pingente, lhe garantira que nada lhe aconteceria, e ao entregá-lo à Lucy, prometera que seria a criança quem agora estaria protegida por um escudo invisível. E ele estava certo. Hammond jamais voltará para casa, mas os Dwyer ainda têm uma chance.
Ao atingirem as margens do rio, Jack tem um momento de fraqueza. Ele pensa em desistir da jornada, as chances batem na casa do zero. A esposa consegue trazê-lo de volta ao equilíbrio, e o rapaz recupera a firmeza para concluir a aventura. Em vias de conseguir um barquinho para descer o rio, 4 bandidos fazendo a varredura na favela ribeirinha o flagram escondido debaixo de uma canoa. Jack luta com os homens, mas eventualmente acaba rendido. Lucy se desespera e sai do esconderijo. O líder do grupo se diverte, colocando uma arma na mão da criança para ver se a garota tem coragem de fazer mal ao pai. Não há limites para a selvageria dos revolucionários. Depois de alguns minutos de puro sadismo, pai e filha indefesos nas mãos dos guerrilheiros, Annie chega por trás, e derruba o líder com um golpe de remo na cabeça. Jack toma um revólver e abre fogo à queima roupa contra os demais. Furiosa, com todo o ódio acumulado por aquela gente, Annie segue golpeando o líder, já desfalecido no chão, pancadas fortíssimas na cabeça em um interminável sobe e desce, até esfacelar o crânio do mercenário.
A família Dwyer embarca na canoa e desce o rio. A fronteira com o Vietnã já pode ser vista a olhos nus. Canhões de luz são subitamente acesos, e soldados vietnamitas ordenam que parem de remar. Jack exclama que buscam asilo, são uma família de norte-americanos cujas vidas correm graves riscos do outro lado da fronteira. Nisso, os guerrilheiros aparecem às margens e apontam os rifles ao barquinho. Os soldados vietnamitas determinam que os americanos agora se encontram no lado do Vietnã, e que se os rebeldes ousarem disparar, executarão uma manobra equivalente a um ato de declaração de guerra. Os revolucionários sabem que agora não estão apenas atormentando uma família indefesa. Eles se meteram com as Forças Armadas de um outro país. Os "valentões" guerrilheiros, assim como qualquer covarde, "colocam o rabo entre as pernas", abaixam as armas e saem. Acolhidos por barcos da Guarda Costeira, a família se abraça, finalmente absolvida daquele pesadelo. Um tempo depois, os reencontramos em uma gloriosa manhã recuperando-se em paz em um arejado quarto de hospital, todos reunidos na mesma cama. Jack conta uma linda história sobre o nascimento de Lucy. Ele e Annie estavam tão felizes que não notaram que a bebezinha não respirava. Jack filmava o parto, pensava que seria o mais importante momento da vida, porém de um minuto para outro o médico o aconselhou a parar, pois parecia haver algo de errado com a filha, e o engenheiro foi tomado por muita angústia e expectativa. Logo, outros médicos apareceram na sala de cirurgia para reanimar Lucy, mas então Jack simplesmente lhe sussurrou, "Respire, Lucy, respire", e como mágica, o bebê voltou a respirar e tudo terminou bem. Jack jurou naquele momento que protegeria as mulheres de sua vida e sempre as manteria fora de perigo... e ele honrou a promessa.
A embaixada norte-americana "caiu". Os soldados americanos estão todos mortos, e o caos reinante indica que os rebeldes conquistaram o último bastião de esperança para os Dwyer. Um grupo de bandidos que deixa o prédio naquele exato momento enxerga Jack, e o teriam matado no ato, não fosse a explosão preparada pelos próprios guerrilheiros, que os faz se distraírem, permitindo que o americano fuja. Entre vielas de uma favela, eles chegam à porta de um idoso que aceita lhes dar guarida. Os mercenários não custam a chegar e a varrer o jardim com sinalizadores para descobrirem a família fugitiva. Eles dominam Jack & Annie. Para a mulher, eles têm estupro em mente. Quando estão para barbarizá-los, quem ressurge com muita comoção é Hammond. Ele dá uma de assustado, pede que não atirem, se comporta meio extravagante, e quando os guerrilheiros abaixam a guarda, o britânico saca a pistola e os acerta implacavelmente, tiros certeiros nas testas. Um dos "mercenários" que o ajudou a derrubar aqueles maníacos, que apenas fingia compor a horda, é seu melhor amigo Kenny Rogers. Ficamos felizes de ver a corja tomar aquilo que merece. Kenny Rogers avista de relance a um dos covardes empreendendo fuga. Puxa casualmente o rifle e o executa com um tiro certeiro. Jack e Annie se abraçam, emocionados, gratos pela chegada de Hammond & Kenny Rogers. Os americanos vocalizam a satisfação em vê-los, mas Hammond lhes lembra que não têm tempo para cenas emotivas. Eles precisam dar o fora dali! Quando Lucy começa a chorar, Hammond se agacha na frente da menina e reitera que não há tempo para lágrimas. Ele tira o pingente do pescoço e o coloca na criança. Hammond explica que fora a filha quem lhe dera o pingente, e dissera que enquanto o usasse, nada de ruim lhe ocorreria. Agora, Hammond repassa o amuleto da sorte à menina e lhe garante que nenhum mal recairá sobre sua pessoa ou aos pais.
Hammond os leva a um lugar semelhante a um prostíbulo. Apesar da decadência do local, o britânico se sente entre amigos. Ali, terão como descansar em paz. Ele os guia até uma caixa d'água que oferece uma vista mais ampla do rio. Hammond senta-se com as meninas ao redor de uma fogueira, onde Kenny Rogers assa uma galinha. Depois de pedir que as meninas se alimentem, o britânico chama Jack & Annie em um canto reservado para explicar o plano. Da caixa d'água, ele estende o braço em direção ao rio, prateado ao toque do luar. Se descerem o rio, eventualmente chegarão à fronteira com o Vietnã, onde certamente lhes darão guarida e os livrarão daquele inferno: os rebeldes não terão como lhes causar mal, não uma vez que se encontrem em território vietnamita. Hammond revela que não é apenas mais um turista afoito pela palpitante vida noturna daquele país asiático. Como agente secreto a serviço de Sua Majestade, sua função revolve se infiltrar em locais instáveis como aquele para estudar sua gente e cultura, e preparar terreno para a "invasão" de multinacionais americanas & europeias como a Cardiff. As construtoras chegam, constroem barragens & represas, o país não tem como pagar pela obra, e então o outro país invasor "se apropria" economicamente de interesses nacionais estratégicos. Os povos usualmente não percebem esse jogo de interesses, mas, por alguma razão, quando a Cardiff fechou o contrato com o Primeiro Ministro para instalar uma barragem, os cidadãos se revoltaram a ponto de derrubar o Governo e promover o Golpe de Estado. Jack não imaginava a política envolvida por trás da construção da barragem, e entre os demais envolvidos, parece o mais inocente. Hammond aconselha o pai de família a dormir, pois estarão partindo dentro de 4 horas. Jack e Annie não conseguem relaxar, mas têm um pouco de paz para conversarem. Ele a agradece por tê-lo apoiado ao longo de todos aqueles anos. Annie responde que não se arrepende da devoção à família, e que sem Jack, jamais teria sido mãe daquelas meninas a quem tanto ama.
Quando Jack e Annie finalmente pegam no sono, o americano desperta horas mais tarde ao escutar Hammond e Kenny Rogers à espreita da sacada. Eles sinalizam que não faça barulho, mas então alguém começa a atirar na caixa d'água, acordando Annie e as crianças. Hammond explica que há 4 atiradores em uma torre de observação, e que precisam deixar a caixa d'água e ganhar o caminho para o rio para a arrancada final rumo à fronteira com o Vietnã. Kenny Rogers é atingido na cabeça, porém Hammond põe o vilão abaixo com um tiro na testa. Outro bandido acerta um disparo no lado do britânico, mas ele mantém a compostura, e mesmo à distância estoura seus miolos. Eles alcançam a rua, e certo de que não conseguirá escapar com os americanos, Hammond recusa a ajuda de Jack. A família quer arrastá-lo dali com vida, porém Hammond prefere que escapem sozinhos. Quando um caminhão aponta no começo da rua e sinaliza que investirá à toda velocidade contra os sobreviventes, Hammond tem uma atitude de impressionante valentia e nobreza ao se colocar bem no meio da via, ficar na trajetória, apontar a pistola e fuzilar o motorista. O disparo vara a testa do bandido, e o caminhão capota e explode. Com o seu sacrifício, Hammond livrou o caminho dos Dwyer até o rio. Tragicamente, conforme explicara para Lucy, quando a filha lhe dera o pingente, lhe garantira que nada lhe aconteceria, e ao entregá-lo à Lucy, prometera que seria a criança quem agora estaria protegida por um escudo invisível. E ele estava certo. Hammond jamais voltará para casa, mas os Dwyer ainda têm uma chance.
Ao atingirem as margens do rio, Jack tem um momento de fraqueza. Ele pensa em desistir da jornada, as chances batem na casa do zero. A esposa consegue trazê-lo de volta ao equilíbrio, e o rapaz recupera a firmeza para concluir a aventura. Em vias de conseguir um barquinho para descer o rio, 4 bandidos fazendo a varredura na favela ribeirinha o flagram escondido debaixo de uma canoa. Jack luta com os homens, mas eventualmente acaba rendido. Lucy se desespera e sai do esconderijo. O líder do grupo se diverte, colocando uma arma na mão da criança para ver se a garota tem coragem de fazer mal ao pai. Não há limites para a selvageria dos revolucionários. Depois de alguns minutos de puro sadismo, pai e filha indefesos nas mãos dos guerrilheiros, Annie chega por trás, e derruba o líder com um golpe de remo na cabeça. Jack toma um revólver e abre fogo à queima roupa contra os demais. Furiosa, com todo o ódio acumulado por aquela gente, Annie segue golpeando o líder, já desfalecido no chão, pancadas fortíssimas na cabeça em um interminável sobe e desce, até esfacelar o crânio do mercenário.
A família Dwyer embarca na canoa e desce o rio. A fronteira com o Vietnã já pode ser vista a olhos nus. Canhões de luz são subitamente acesos, e soldados vietnamitas ordenam que parem de remar. Jack exclama que buscam asilo, são uma família de norte-americanos cujas vidas correm graves riscos do outro lado da fronteira. Nisso, os guerrilheiros aparecem às margens e apontam os rifles ao barquinho. Os soldados vietnamitas determinam que os americanos agora se encontram no lado do Vietnã, e que se os rebeldes ousarem disparar, executarão uma manobra equivalente a um ato de declaração de guerra. Os revolucionários sabem que agora não estão apenas atormentando uma família indefesa. Eles se meteram com as Forças Armadas de um outro país. Os "valentões" guerrilheiros, assim como qualquer covarde, "colocam o rabo entre as pernas", abaixam as armas e saem. Acolhidos por barcos da Guarda Costeira, a família se abraça, finalmente absolvida daquele pesadelo. Um tempo depois, os reencontramos em uma gloriosa manhã recuperando-se em paz em um arejado quarto de hospital, todos reunidos na mesma cama. Jack conta uma linda história sobre o nascimento de Lucy. Ele e Annie estavam tão felizes que não notaram que a bebezinha não respirava. Jack filmava o parto, pensava que seria o mais importante momento da vida, porém de um minuto para outro o médico o aconselhou a parar, pois parecia haver algo de errado com a filha, e o engenheiro foi tomado por muita angústia e expectativa. Logo, outros médicos apareceram na sala de cirurgia para reanimar Lucy, mas então Jack simplesmente lhe sussurrou, "Respire, Lucy, respire", e como mágica, o bebê voltou a respirar e tudo terminou bem. Jack jurou naquele momento que protegeria as mulheres de sua vida e sempre as manteria fora de perigo... e ele honrou a promessa.
John
Erick Dowdle, um dos mais excitantes diretores do horror, retorna às telas de
cinema com esse empolgante suspense que parte de uma consagrada fórmula e a
expande a novos, interessantes horizontes. O talentoso cineasta, que já no filme de
estreia "Poughkeepsie Tapes" sinalizava coisas grandiosas por vir, sustenta o
excelente momento na carreira, seguindo o sucesso de público & crítica
de "As Above so Below" com uma nova aventura em um país estrangeiro. Se antes
seus heróis viveram uma fuga aterrorizante através das catacumbas sob Paris, Dowdle
agora aterrissa em um país inominado do Sudeste da Ásia para mais um espetáculo de puro terror.
"Horas de Desespero" não somente representa um momento feliz na filmografia do cineasta,
como também permite a seus atores, todos artistas consagrados vindos de gêneros tão
distintos, reinventarem-se neste implacável, claustrofóbico conto que os lançará a uma terra longínqua e estranha onde a Lei como a conhecemos
não se aplica. Curiosamente, a minha observação revisita a novidade iniciada com
o último filme analisado no blog, o extraordinário "O Presente", dirigido/estrelado
por Joel Edgerton: se em "O Presente" tivemos o prazer de assistir a Jason Bateman, tão familiarizado a comédias inteligentes, entregar
uma performance perfeita em um thriller de mistério, desta vez é Owen Wilson,
um ator muito querido que conquistou fãs em filmes dramáticos/românticos
como "Marley & Eu", quem passa pelo teste do fogo em uma obra de absoluta
desesperança & horror, e sai vitorioso ao final. Coadjuvado pelo astro
Pierce Brosnan, que há muito tempo não se divertia tanto, Wilson prova a versatilidade, silenciando os críticos que o associam
primordialmente a comédias românticas, comandando agora a atenção no papel de um
pai de família hesitante, mas heroico, por quem torcemos do começo ao explosivo
fim. Ele interpreta o tipo de papel que tornou Harrison Ford famoso: o herói relutante cuja empatia com o público se dá pelo viés da identificação. Conhecido pelo jeitão bem-humorado & simpático com que conduz suas performances, Owen Wilson traz à vida um bom pai & marido que mesmo vacilante descobre dentro de si o heroísmo para ir superando os obstáculos que aparecem no caminho até a fronteira com o Vietnã. Apesar das proezas impressionantes que consegue realizar no caminho, Wilson jamais nos é apresentado como um super herói imbatível. Seu charme reside nos instantes de vulnerabilidade que emulam o tão importante realismo, como na cena quando se encontram a apenas algumas dezenas de metros do rio, e ele tem um momento altamente emocional e chora. Sua performance funciona como uma espécie de releitura do que o astro Jon Voight fez tão maravilhosamente em "Deliverance", de 1972, do diretor John Boorman. Brosnan, por sua vez, se diverte como nunca. Eu imagino que ele deva ter encarado a oportunidade de interpretar Hammond como uma revisita ao seu papel mais famoso: Hammond é um ex-agente secreto britânico, e ao vê-lo em cena com camisa havaiana, barba por fazer, meio alcoolizado e com uma protuberante barriga, eu não tive como deixar de imaginá-lo como uma versão alternativa de 007, ou melhor, James Bond após a aposentadoria! Eu imagino o 007 meio barrigudo e de barba rala namorando as garotas locais em nightclubs de algum país asiático, ou mesmo da América do Sul, quem sabe o Brasil, e se divertindo entre rodadas de drinques e partidas de karaokê. No instante da grande virada, quando Annie está em vias de ser estuprada por bandidos malévolos e cruéis, e Pierce Brosnan subitamente saca a arma e elimina os vilões em um piscar de olhos, não temos como deixar de torcer e aplaudir, pois associamos imediatamente o personagem ao papel heroico que o tornou um astro muito querido. Assim como ocorre a Rocky, Rambo, Superman & Os Vingadores, James Bond compõe o imaginário de heróis queridos por quem amamos torcer. Sempre é fantástico assistir a vilões levando o castigo que merecem, mas vê-los encontrando um fim pelas mãos de um ícone é ainda melhor!
Com "Horas de Desespero", o diretor John Erick Dowdle reciclou a saudosa fórmula dos filmes de George Romero ("A Noite dos Mortos-Vivos" & "Dia dos Mortos"), e a partir da vencedora premissa - a luta pela sobrevivência contra uma horda incontrolável e maciça de zumbis - derivou a trama com sensacionais sacadas que imbuíram o trabalho de um ar de sofisticação e novidade. Enquanto nos filmes de George Romero os protagonistas se viam cercados por mortos-vivos movidos unicamente pelo apetite, o diretor Dowdle substituiu a massa de zumbis por uma outra composta por monstros com faces humanas, dotados de inteligência. Nesse sentido, ao passo em que nos clássicos a questão resumia-se à sobrevivência de pessoas comuns em situações extraordinárias envolvendo mortos-vivos imparciais e selvagens, os monstros do filme de Dowdle são "politizados", dotados da inteligência que lhes permite fazer algo mais do que simplesmente avançar em direção às vítimas ou mesmo demonstrar incongruente compaixão (quando apesar de identificá-los como estrangeiros, um revolucionário omite a descoberta movido por uma consciência). Os protagonistas de "Horas de Desespero" não apenas precisam sobreviver a uma multidão de pessoas furiosas, também devem contar com a inteligência para se evadir de todos os becos sem saída a que os guerrilheiros tentam empurrá-los ao longo da jornada. Quando assistimos a algo como o excitante "Madrugada dos Mortos", de 2004 (por sua vez um remake do original de Romero, "Dawn of the Dead", de 1978), os sobreviventes enclausurados dentro de um shopping center deserto enquanto do lado de fora milhares de zumbis se agregam para invadir, podemos assumir que por mais absurda que pareça a diferença numérica entre os monstros e os poucos sobreviventes, os heróis podem confiar no próprio raciocínio lógico para armar uma estratégia apta a compensar a brutal desigualdade. A regra não se aplica a "Horas de Desespero", pois os inimigos não apenas estão em pé de igualdade com a presa, no que se refere à capacidade de raciocinar, eles são cidadãos locais, conhecedores das rotas de escoamento da região. O filme tem recebido críticas de "unidimensional". Para os detratores, os asiáticos ou são exibidos como selvagens sanguinolentos ou bucha de canhão. Eu gostaria de defender o diretor e mencionar que em aproximadamente 100 minutos ele precisa eleger as prioridades. Imagino que Dowdle teria apreciado mais tempo para destrinchar os guerrilheiros, ou parte deles, todavia sabe que precisa olhar para seus protagonistas, a família norte-americana, com mais cuidado. A extensão da caracterização dos revolucionários deixa a desejar. De fato, devem ser vistos como um todo só, uma grande massa destruidora, talvez nos mesmos moldes do que Clive Barker escreveu em "In the Hills, the Cities". Não exclusivamente as obras de George Romero parecem ter influenciado o diretor Dowdle. Ao examinarmos o plano de fundo da trama - o fim de qualquer resquício de ordem social, uma sociedade mergulhada no caos, a inutilidade de normas e regras - "Horas de Desespero" nos devolve ao mesmo cenário da eletrizante franquia "Uma Noite de Crime", sobre a qual discorri extensivamente neste blog. Mais especificamente, o formato da aventura de John Erick Dowdle pega emprestado muitos elementos de "Uma Noite de Crime 2", que também lança os personagens em uma selvagem batalha pela sobrevivência tendo downtown Los Angeles como palco. Ironicamente, somos levados a crer que ao menos em downtown Los Angeles aquela gente se sentiria ao menos familiarizada com o bairro, certo? Pois saibam que não. Levantado o peso das regras inibitórias do Estado, as normas atiradas ao cesto de lixo, downtown Los Angeles parece um coliseu de batalha alienígena e misterioso, tão indecifrável e imprevisível quanto um país qualquer do Sudeste da Ásia. A visão apocalíptica de uma cidade em caos, a seu turno, presta homenagem a "Extermínio 2", de Juan Carlos Fresnadillo, estrelando Rose Byrne, sobre uma Londres em quarentena em razão de um vírus potencializado da Raiva, e os soldados (Rose Byrne & Jeremy Renner) que lutam para tirar duas crianças sãs & salvas daquele inferno de infectados. Diferente de "Extermínio 2", onde infelizmente o diretor Fresnadillo não consegue tornar envolvente a relação entre os personagens, dos protagonistas de "Horas de Desespero" emana um senso de família unida, da primeira à última cena, e os laços de amizade que fazem com Kenny Rogers & Hammond parecem críveis e sinceros, cheios de passagens contundentes, como quando o personagem de Pierce Brosnan passa à Lucy sua mais valiosa posse, o pingente. Sob um ponto de vista mais realista, o plano de fundo para a trama não se deve exclusivamente à fantasia. Algo no tom da produção de John Erick Dowdle me fez pensar no assombroso "The Killing Fields", a produção de 1984 vencedora de diversos Oscar que reconta um determinado período de horror da História Cambojana, cidadãos aprisionados a um pesadelo, de 1975 a 1979, anos que envolveram a escalada ao poder e posterior queda do Regime do Khmer Rouge. Em muitos documentários sobre o holocausto cambojano, podemos assistir a imagens reais daquela manhã de 17 de abril de 1975 quando o Khmer Rouge marchou vitorioso para dentro de Phnom Penh. Inicialmente, as pessoas os receberam com aplausos e manifestações de carinho, todavia em questão de horas os revolucionários mostraram suas verdadeiras intenções, ao tanger aquela gente inocente como gado, agrupando-a para a marcha, através da qual esvaziariam a capital e as levariam a viver em fazendas coletivas onde seriam submetidas a toda sorte de lavagem cerebral, tortura e sofrimento psicológico. O filme "The Killing Fields" reconta essa macabra história com riqueza de detalhes, vista através dos olhos de Dith Pran, jornalista & intérprete cambojano a serviço do The New York Post que se vê arrastado de uma hora à outra a aquele turbilhão quando o Khmer Rouge sobe ao poder. O papel valeu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante ao Dr. Haing S. Ngor (um médico na vida real, que sentiu na pele os horrores do Regime). Na ocasião do recebimento da estatueta disse que seu coração finalmente se sentia em paz, pois acreditava que realizara algo perfeito ao denunciar, com seu filme, os horrores perpetrados por aqueles monstros. Talvez, a força da obra se deva à exposição à esmagadora indiferença fatalista do destino: imagine encontrar-se em Phnom Penh bem na manhã daquele golpe. O que você faria para se evadir da manada? "Horas de Desespero" provoca a desafiadora questão, com um adendo: é claro que ninguém gostaria de dar um passo em direção ao mais absoluto totalitarismo, no entanto considerem ver-se encurralado em tamanha cilada ao lado de pessoas que você ama, esposa e filhos por exemplo. Só a premissa soa suficientemente angustiante. Não se trata apenas de seu bem-estar, a equação envolve as pessoas que você mais ama. Curiosamente, ainda no que importa à inspiração em fatos verídicos, John Erick Dowdle usou como massa de modelar um evento do passado, quando criança: seu pai o havia levado à Tailândia com o irmão Drew, quando sem sobreaviso um coup d'État derrubou o Primeiro Ministro. Claro, os eventos não se desdobraram da maneira tenebrosa que assistimos no filme, porém Dowdle menciona que se recorda da atmosfera de inquietação e incerteza nas ruas, um sentimento geral de impotência diante de circunstâncias políticas imprevisíveis. Ao longo de todos aqueles anos, ele se perguntou o que teria acontecido se as coisas tivessem de fato saído dos trilhos, e o resultado foi o roteiro e mais tarde o filme, ambos fundamentados em um episódio marcante da infância, o período de nossas vidas em que nossos maiores horrores são formados.
Tecnicamente, "Horas de Desespero" não deve ter sido um filme fácil de rodar. Ao assistir a produções recheadas de cenas de batalha, seja guerrilha urbana, sejam embates à espada estilo "Excalibur", sequências de grandes conflitos sempre me deixaram intrigado, pois não consigo sequer imaginar a dificuldade para conceber coreografias tão complicadas, a envolver o trabalho coordenado de uma infinidade de pessoas. Se dirigir uma cena de ação típica demanda de um cineasta e equipe dias até parecer esteticamente bela para as câmeras, imaginem a mesma coisa, rodada sob uma escala infinitamente maior, e ao invés de dois atores no "mano a mano", multidões se digladiando impiedosamente, estilo "Coração Valente"? A guerrilha em "Horas de Desespero" segue o estilo e a dinâmica do recente "5 Dias de Guerra", do diretor Renny Harlin, uma aventura sobre o recente conflito Rússia/Geórgia em 2008 estrelado por Rupert Friend e grande elenco. Assim como ocorre na produção de Harlin, no filme de John Erick Dowdle, enxergamos tanques marchando pelas ruas, caminhões de milícia, prédios decadentes carcomidos pelo conflito bélico a se dar em plenas vias públicas e, de maneira geral, a atmosfera de completo desespero, apropriada a circunstâncias tão dramáticas que mesmo hoje ainda compõem parte da História Moderna. A realização de cenas semelhantes deve demandar uma sincronia invejável de diversos profissionais, e em "Horas de Desespero" as situações de conflito urbano gozam do realismo que não abre espaço a dúvidas quanto a gravidade do prognóstico político e instabilidade nas ruas. Em cenas do tipo, eu costumo não prestar muita atenção ao foco, ou melhor, aos protagonistas, e sim ao plano de fundo, para verificar se o caos parece real, e enquanto Owen Wilson ocupa o primeiro plano, atrás do herói e por todos os lados a revolução parece muito autêntica. "Horas de Desespero" te arrastará a uma zona de guerra como poucos filmes fizeram antes.
Incrivelmente eletrizante, "Horas de Desespero" é um dos filmes mais completos de 2015, pois cobre um amplo espectro, oferecendo a todos um pouco do que gostariam de ver no cinema: quem sente falta da tensão incessante de "Extermínio", "Madrugada dos Mortos" e os clássicos de George Romero encontrará uma intrigante variação da consagrada fórmula "sobreviventes vs. mortos-vivos"; quem há muito deseja ver um thriller como os de antigamente, sobre protagonistas hostilizados em um meio que ignoram, estilo "Deliverance" & "Sob o Domínio do Medo", admirará a habilidade com que Dowdle acessa a paranoia de se encontrar em uma terra misteriosa e ameaçadora; aqueles que preferem não pensar bastante, apenas se desligarem por 100 minutos com um filme de ação revestido dos melhores valores dos sucessos do passado também apreciarão "Horas de Desespero". De toda sorte, considerando o termômetro mundial e o conturbado período da geopolítica que o planeta atravessa, tramas como a do filme de John Erick Dowdle jamais pareceram tão sinistramente possíveis & próximas.
Todos os direitos autorais reservados a Weinstein Company. O uso do trailer é para efeito meramente ilustrativo da resenha.
Com "Horas de Desespero", o diretor John Erick Dowdle reciclou a saudosa fórmula dos filmes de George Romero ("A Noite dos Mortos-Vivos" & "Dia dos Mortos"), e a partir da vencedora premissa - a luta pela sobrevivência contra uma horda incontrolável e maciça de zumbis - derivou a trama com sensacionais sacadas que imbuíram o trabalho de um ar de sofisticação e novidade. Enquanto nos filmes de George Romero os protagonistas se viam cercados por mortos-vivos movidos unicamente pelo apetite, o diretor Dowdle substituiu a massa de zumbis por uma outra composta por monstros com faces humanas, dotados de inteligência. Nesse sentido, ao passo em que nos clássicos a questão resumia-se à sobrevivência de pessoas comuns em situações extraordinárias envolvendo mortos-vivos imparciais e selvagens, os monstros do filme de Dowdle são "politizados", dotados da inteligência que lhes permite fazer algo mais do que simplesmente avançar em direção às vítimas ou mesmo demonstrar incongruente compaixão (quando apesar de identificá-los como estrangeiros, um revolucionário omite a descoberta movido por uma consciência). Os protagonistas de "Horas de Desespero" não apenas precisam sobreviver a uma multidão de pessoas furiosas, também devem contar com a inteligência para se evadir de todos os becos sem saída a que os guerrilheiros tentam empurrá-los ao longo da jornada. Quando assistimos a algo como o excitante "Madrugada dos Mortos", de 2004 (por sua vez um remake do original de Romero, "Dawn of the Dead", de 1978), os sobreviventes enclausurados dentro de um shopping center deserto enquanto do lado de fora milhares de zumbis se agregam para invadir, podemos assumir que por mais absurda que pareça a diferença numérica entre os monstros e os poucos sobreviventes, os heróis podem confiar no próprio raciocínio lógico para armar uma estratégia apta a compensar a brutal desigualdade. A regra não se aplica a "Horas de Desespero", pois os inimigos não apenas estão em pé de igualdade com a presa, no que se refere à capacidade de raciocinar, eles são cidadãos locais, conhecedores das rotas de escoamento da região. O filme tem recebido críticas de "unidimensional". Para os detratores, os asiáticos ou são exibidos como selvagens sanguinolentos ou bucha de canhão. Eu gostaria de defender o diretor e mencionar que em aproximadamente 100 minutos ele precisa eleger as prioridades. Imagino que Dowdle teria apreciado mais tempo para destrinchar os guerrilheiros, ou parte deles, todavia sabe que precisa olhar para seus protagonistas, a família norte-americana, com mais cuidado. A extensão da caracterização dos revolucionários deixa a desejar. De fato, devem ser vistos como um todo só, uma grande massa destruidora, talvez nos mesmos moldes do que Clive Barker escreveu em "In the Hills, the Cities". Não exclusivamente as obras de George Romero parecem ter influenciado o diretor Dowdle. Ao examinarmos o plano de fundo da trama - o fim de qualquer resquício de ordem social, uma sociedade mergulhada no caos, a inutilidade de normas e regras - "Horas de Desespero" nos devolve ao mesmo cenário da eletrizante franquia "Uma Noite de Crime", sobre a qual discorri extensivamente neste blog. Mais especificamente, o formato da aventura de John Erick Dowdle pega emprestado muitos elementos de "Uma Noite de Crime 2", que também lança os personagens em uma selvagem batalha pela sobrevivência tendo downtown Los Angeles como palco. Ironicamente, somos levados a crer que ao menos em downtown Los Angeles aquela gente se sentiria ao menos familiarizada com o bairro, certo? Pois saibam que não. Levantado o peso das regras inibitórias do Estado, as normas atiradas ao cesto de lixo, downtown Los Angeles parece um coliseu de batalha alienígena e misterioso, tão indecifrável e imprevisível quanto um país qualquer do Sudeste da Ásia. A visão apocalíptica de uma cidade em caos, a seu turno, presta homenagem a "Extermínio 2", de Juan Carlos Fresnadillo, estrelando Rose Byrne, sobre uma Londres em quarentena em razão de um vírus potencializado da Raiva, e os soldados (Rose Byrne & Jeremy Renner) que lutam para tirar duas crianças sãs & salvas daquele inferno de infectados. Diferente de "Extermínio 2", onde infelizmente o diretor Fresnadillo não consegue tornar envolvente a relação entre os personagens, dos protagonistas de "Horas de Desespero" emana um senso de família unida, da primeira à última cena, e os laços de amizade que fazem com Kenny Rogers & Hammond parecem críveis e sinceros, cheios de passagens contundentes, como quando o personagem de Pierce Brosnan passa à Lucy sua mais valiosa posse, o pingente. Sob um ponto de vista mais realista, o plano de fundo para a trama não se deve exclusivamente à fantasia. Algo no tom da produção de John Erick Dowdle me fez pensar no assombroso "The Killing Fields", a produção de 1984 vencedora de diversos Oscar que reconta um determinado período de horror da História Cambojana, cidadãos aprisionados a um pesadelo, de 1975 a 1979, anos que envolveram a escalada ao poder e posterior queda do Regime do Khmer Rouge. Em muitos documentários sobre o holocausto cambojano, podemos assistir a imagens reais daquela manhã de 17 de abril de 1975 quando o Khmer Rouge marchou vitorioso para dentro de Phnom Penh. Inicialmente, as pessoas os receberam com aplausos e manifestações de carinho, todavia em questão de horas os revolucionários mostraram suas verdadeiras intenções, ao tanger aquela gente inocente como gado, agrupando-a para a marcha, através da qual esvaziariam a capital e as levariam a viver em fazendas coletivas onde seriam submetidas a toda sorte de lavagem cerebral, tortura e sofrimento psicológico. O filme "The Killing Fields" reconta essa macabra história com riqueza de detalhes, vista através dos olhos de Dith Pran, jornalista & intérprete cambojano a serviço do The New York Post que se vê arrastado de uma hora à outra a aquele turbilhão quando o Khmer Rouge sobe ao poder. O papel valeu o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante ao Dr. Haing S. Ngor (um médico na vida real, que sentiu na pele os horrores do Regime). Na ocasião do recebimento da estatueta disse que seu coração finalmente se sentia em paz, pois acreditava que realizara algo perfeito ao denunciar, com seu filme, os horrores perpetrados por aqueles monstros. Talvez, a força da obra se deva à exposição à esmagadora indiferença fatalista do destino: imagine encontrar-se em Phnom Penh bem na manhã daquele golpe. O que você faria para se evadir da manada? "Horas de Desespero" provoca a desafiadora questão, com um adendo: é claro que ninguém gostaria de dar um passo em direção ao mais absoluto totalitarismo, no entanto considerem ver-se encurralado em tamanha cilada ao lado de pessoas que você ama, esposa e filhos por exemplo. Só a premissa soa suficientemente angustiante. Não se trata apenas de seu bem-estar, a equação envolve as pessoas que você mais ama. Curiosamente, ainda no que importa à inspiração em fatos verídicos, John Erick Dowdle usou como massa de modelar um evento do passado, quando criança: seu pai o havia levado à Tailândia com o irmão Drew, quando sem sobreaviso um coup d'État derrubou o Primeiro Ministro. Claro, os eventos não se desdobraram da maneira tenebrosa que assistimos no filme, porém Dowdle menciona que se recorda da atmosfera de inquietação e incerteza nas ruas, um sentimento geral de impotência diante de circunstâncias políticas imprevisíveis. Ao longo de todos aqueles anos, ele se perguntou o que teria acontecido se as coisas tivessem de fato saído dos trilhos, e o resultado foi o roteiro e mais tarde o filme, ambos fundamentados em um episódio marcante da infância, o período de nossas vidas em que nossos maiores horrores são formados.
Tecnicamente, "Horas de Desespero" não deve ter sido um filme fácil de rodar. Ao assistir a produções recheadas de cenas de batalha, seja guerrilha urbana, sejam embates à espada estilo "Excalibur", sequências de grandes conflitos sempre me deixaram intrigado, pois não consigo sequer imaginar a dificuldade para conceber coreografias tão complicadas, a envolver o trabalho coordenado de uma infinidade de pessoas. Se dirigir uma cena de ação típica demanda de um cineasta e equipe dias até parecer esteticamente bela para as câmeras, imaginem a mesma coisa, rodada sob uma escala infinitamente maior, e ao invés de dois atores no "mano a mano", multidões se digladiando impiedosamente, estilo "Coração Valente"? A guerrilha em "Horas de Desespero" segue o estilo e a dinâmica do recente "5 Dias de Guerra", do diretor Renny Harlin, uma aventura sobre o recente conflito Rússia/Geórgia em 2008 estrelado por Rupert Friend e grande elenco. Assim como ocorre na produção de Harlin, no filme de John Erick Dowdle, enxergamos tanques marchando pelas ruas, caminhões de milícia, prédios decadentes carcomidos pelo conflito bélico a se dar em plenas vias públicas e, de maneira geral, a atmosfera de completo desespero, apropriada a circunstâncias tão dramáticas que mesmo hoje ainda compõem parte da História Moderna. A realização de cenas semelhantes deve demandar uma sincronia invejável de diversos profissionais, e em "Horas de Desespero" as situações de conflito urbano gozam do realismo que não abre espaço a dúvidas quanto a gravidade do prognóstico político e instabilidade nas ruas. Em cenas do tipo, eu costumo não prestar muita atenção ao foco, ou melhor, aos protagonistas, e sim ao plano de fundo, para verificar se o caos parece real, e enquanto Owen Wilson ocupa o primeiro plano, atrás do herói e por todos os lados a revolução parece muito autêntica. "Horas de Desespero" te arrastará a uma zona de guerra como poucos filmes fizeram antes.
Incrivelmente eletrizante, "Horas de Desespero" é um dos filmes mais completos de 2015, pois cobre um amplo espectro, oferecendo a todos um pouco do que gostariam de ver no cinema: quem sente falta da tensão incessante de "Extermínio", "Madrugada dos Mortos" e os clássicos de George Romero encontrará uma intrigante variação da consagrada fórmula "sobreviventes vs. mortos-vivos"; quem há muito deseja ver um thriller como os de antigamente, sobre protagonistas hostilizados em um meio que ignoram, estilo "Deliverance" & "Sob o Domínio do Medo", admirará a habilidade com que Dowdle acessa a paranoia de se encontrar em uma terra misteriosa e ameaçadora; aqueles que preferem não pensar bastante, apenas se desligarem por 100 minutos com um filme de ação revestido dos melhores valores dos sucessos do passado também apreciarão "Horas de Desespero". De toda sorte, considerando o termômetro mundial e o conturbado período da geopolítica que o planeta atravessa, tramas como a do filme de John Erick Dowdle jamais pareceram tão sinistramente possíveis & próximas.